01/12/2023
Há 100 anos, a 1 de dezembro de 1923, arrancou a sessão de Lisboa do III Congresso Pan-Africano. O evento durou 2 dias e aconteceu junto ao Rossio, no n.º 25 da Travessa do Carmo. Nele esteve presente o ativista e académico afro-americano W.E.B. Du Bois, figura cimeira do Pan-Africanismo e ainda hoje um clássico (silenciado) da sociologia. Sobre este encontro correria muita tinta na imprensa negra de Lisboa e há referência ao mesmo na revista The Crisis da NAACP. Na lista de presenças guardada nos arquivos de Du Bois constam os nomes de 34 participantes. Muitos deles viviam em Lisboa, eram, sobretudo, de S. Tomé e Príncipe e, em contraste com a maioria da população negra, formavam uma elite. Ao contrário do que vinha sendo uma tendência dos Congressos Pan-Africanos anteriores (1919 e 1921), a sessão de Lisboa não parece ter contado com a participação de mulheres negras, o que não deixa de ser revelador. Em pauta estiveram, entre outros assuntos, o momento e as perspetivas futuras do movimento pan-africano, assim como a situação específica da população negra nos EUA e em S. Tomé e Príncipe. Há controvérsia sobre se esta terá sido uma verdadeira sessão dos Congressos Pan-Africanos. A “mítica” sessão de Lisboa evidenciou o envolvimento dos ativistas negros em Portugal num momento-chave e tenso da trajetória do Pan-Africanismo. Para além das relações com organizações políticas em África, o internacionalismo negro construído a partir de Lisboa passou ainda por conexões, de intensidade distinta, com o garveyismo da UNIA, com o marxismo negro e com a realidade afro-brasileira. Passados 100 anos da sessão de Lisboa do III Congresso Pan-Africano, vale a pena recordá-la e inscrevê-la enquanto marco da longa luta contra o racismo em Portugal.