08/08/2024
RCI08AGO24
Corrida uma semana de Feira Franca, marcada pela diversidade de estilos e formatos, sai o pleito para a segunda semana, sem que as pessoas percebam a dimensão colossal de uma feira que tem no povo e nas suas associações, um dos esteios. Vem isto a propósito de um tempo em que eu, com 16 anos, era valdevinos profissional e os Bombeiros Voluntários de Viseu, onde havia ingressado, me deram a mão e a central telefónica.
Telefonista a cada três noites, nove contos de réis no final do mês, chegava a Feira de S. Mateus e via o quartel f**ar vazio. As viaturas brilhavam, as medalhas nos uniformes lampejavam e o brio dos Bombeiros resplandecia. O rutilar era norma e, nos anos em que me calhava ter lugar nos camiões, lá ia eu, enquadrado, ver o espetáculo que terminava sempre com farturas, vinho verde e alegre convívio entre artistas, comando e direção e, claro, os bombeiros.
No picadeiro, as viaturas, nos espetadores o orgulho em ver quem garantia segurança.
Além da história da Feira estar intimamente ligada aos Bombeiros Voluntários de Viseu, por razões que cuidei de explicar em 2017 e 2023, o dinheiro ali suado, tinha destino meritório.
Um concelho da grandeza de Viseu não se pode dar ao luxo de ter esta pobreza de equipamentos.
Ora ainda esta semana ouvimos o Presidente da Câmara de Viseu reconhecer o “sucesso na história dos bombeiros profissionais no concelho”. Temos capital humano e as duas companhias, Voluntários e Sapadores, chegam para as encomendas. Mas faltam equipamentos: plataformas elevatórias, desencarceramento, viaturas com grande capacidade de espuma devido à nossa localização e outras coisas menores.
Quis o destino que este ano, a grande figura de cartaz da Feira Franca, fosse obnubilada. Levaram o Dia dos Bombeiros Voluntários de Viseu da Feira de S. Mateus, que permitia à corporação arrecadar alguns milhares que lhe faziam suprir carências de equipamento. Se a segurança é obrigação do Estado, todos nós temos de nos preocupar com a defesa civil.
E se o orçamento é curto para tantas necessidades, que se preserve a história, a tradição e se promova uma Feira com responsabilidade social.
Apagar do calendário o dia dos Bombeiros Voluntários de Viseu, é coisa que me aborrece. E mesmo que botem remendo na agenda, foi-se a promoção e o conhecimento de quem está.
Em média o dia dá de receita dez mil euros, um pouco mais, talvez, que alivia o tesoureiro e cuida do bem comum.
Não perceber isto não chega a ser destrato, é insulto à memória dos viseenses e faz de um certame secular, um evento sazonal.
A governança ambiental, social e corporativa é critério obrigatório para as sociedades modernas. Gestão moderna quando, bem o sabemos, o dinheiro da fazenda municipal não chega a tudo, mas esta comunidade pode, deve e tem o direito de intimar a que todos juntos tenhamos um objetivo comum, apesar das diferenças que cada individuo ou instituição congregam.
A Feira de S. Mateus é hoje uma empresa, e bem, mas que utiliza as infraestruturas municipais. Só por isso tem o direito de retornar ao concelho parte dos ganhos. Solidariedade que anda arredada por alguns que confundem brio com altivez.
A ida de um Presidente de Câmara e de uma empresa a um quartel de bombeiros, para entregar um cheque, não é folclore, é responsabilidade social.
Um dia fundamental que capto dos últimos anos, que deixa palco vazio, parceria desfeita, num percurso invulgar, que não entende o que é conduzir e liderar.
E nisto, regresso quatro décadas atrás, quando via os camiões partir e eu, sozinho, na central telefónica. Com uma diferença. Este ano os camiões não sairão do quartel.
Extremamente original esta ideia de surpreender o público pela ausência, de um dos dias mais populares do reportório.
É tradição que se perde, quando alijamos a pertinência das parcerias assumidas e nos deixamos levar por coletivos fora de órbita.
(foto via Facebook ‘Encantos de Viseu’)