Vidas Alternativas Portugal - Brasil

Vidas Alternativas Portugal - Brasil Desde 2013,
OBJECTO SOCIAL: Lutar por uma sociedade cosmopolita e diversif**ada, em igualdade de opo

A NOSSA HISTÓRIA

O projecto de rádio " VIDAS ALTERNATIVAS " começou há 22 anos na Rádio VOXX, com transmissão em directo. Éramos quatro inicialmente, agora somos dois, eu António Serzedelo e o Miguel Rodeia. O programa tem como lema: "UM PROGRAMA MUITO POUCO CATÓLICO, PARA TODOS OS PROTESTANTES SOCIAIS". Como dizíamos coisas fortes, por vezes incómodas a muita gente, um destacado membro do partid

o CDS comprou a rádio, fechando-a numa semana com o intuito de nos calar. O programa foi então para a Rádio Seixal que nos acolheu durante um ano, tendo passado a ser transmitido através sítio na internet:
WWW.VIDASALTERNATIVAS.ORG
Sítio este, que já sofreu três ciber-ataques três vezes por hackers fascistas e duas vezes por portugueses. António Serzedelo
+info in : https://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_Serzedelo

Nem sempre se vai uma só vez à guerra, também reescrevemos o passado em seara alheiaMário Beja SantosQuando em pedem, em...
03/01/2025

Nem sempre se vai uma só vez à guerra, também reescrevemos o passado em seara alheia

Mário Beja Santos

Quando em pedem, em traços gerais, uma sinopse sobre a literatura da guerra colonial, refiro, em primeiro lugar, um ciclo de obras de exaltação e de exultação, onde não faltou o panegírico propagandístico feito por repórteres e crentes nacionalistas, houve quem tivesse escrito ao arrepio dessas linhas de patriotismo ou brio militar, obra encriptada, foi o caso de Álvaro Guerra, isto até ao 25 de Abril; a liberdade de expressão deu azo a uma multiplicidade de obras, um rio estuante de romance, poesia, ensaio histórico, conto e até os balbucios da veia memorial; nas décadas de 1980 e 1990, feita a distanciação necessária aos combatentes, surgiram belíssimos romances; indo por aí fora, chegamos ao nosso tempo marcado pela literatura memorial, mas casos há em que escritores de romances, e que parecia que tudo já tinham contado sobre as suas experiências (não haja ilusões, estes romances da guerra colonial não são pura ficção, são biografias romanceadas), voltam ao terreno do combate misturando as suas biografias com enredos ficcionados – é a necessidade de reescrever o seu passado pondo a escrita em seara alheia, serão, porventura, processos de sublimação não descurando o alerta às novas gerações. É o caso da literatura de Carlos Vale Ferraz, João de Melo, António Brito ou Rui de Azevedo Teixeira. Este universitário, com obra extensa dedicada à literatura da guerra colonial, lançou mão a um ciclo de romances que começou com O Elogio da Dureza a que se seguiu O Longo Braço do Passado, Guerra e Paz, 2022, é o segundo volume deste ciclo intitulado A Vida Aventureira de um Homem de Letras.

O personagem principal é Paulo de Trava Lobo, um alter-ego do escritor. Paulo volta a Angola, como professor, é cooperante, vai dar-nos um registo de Angola pós-independência, começa por Luanda, o país é dominado pelo MPLA apoiado em cubanos e russos, já houve a purga de Nito Alves e seus apoiantes. Paulo visita os seus lugares de Luanda, foi alferes dos Comandos, percorre a cidade marcada pela guerra, vive-se de esquemas, ele assiste a gente esfomeada à procura de comida em caixotes do lixo, faz amizade com Pedro K**a, na estúrdia começa a cometer infidelidades à mulher, Iza, adorada à distância. Segue para o Lubango, ouvem-se os bombardeamentos dos sul-africanos. Vive as contingências da guerra, almoços invariáveis de arroz e peixe frito, por ali circulam gentes de várias nacionalidades, não faltam informadores. É apresentado à búlgara Diana Sotirova, a relação dará faísca.

Segue-se uma descrição arrasadora do ensino universitário da terra, papagueia-se o marxismo-leninismo, embora haja quem ande a sabotar o socialismo científico e a verdade soviética, ostentam-se currículos adquiridos à custa da compra de títulos, uma pouca-vergonha. É-nos apresentado quem vive no Grande Hotel da Huíla e a liberdade sexual instituída. Paulo é um professor devotado, os alunos seguem assombrados a sua euforia profissional. O seu instinto de Comando vai ser despertado quando Pedro K**a anuncia que lhe mataram a irmã, o assassino fora um capitão das FAPLA. Fala-se dos horrores praticados por gente do MPLA, da vingança de Agostinho Neto sobre Nito Alves, do banho de sangue. Paulo depara-se com o guerrilheiro, de nome Log, que comandara uma grande emboscada à Companhia de Comandos, na zona do Luvuéi, entre o Luso e Gago Coutinho. Esboça-se o plano de matar o assassino da irmã de K**a, o assassino cai numa emboscada m***ada por K**a e Paulo, é esquartejado e depois enterrado. “O antigo alferes dos Comandos portugueses em Angola e um agente das secretas angolanas tinham enterrado um capitão das FAPLA. Paulo e K**a tinham um pacto de sangue. Para sempre.” Voltamos ao Lubango, Paulo escreve um diário, sente-se feliz a dar aulas, tem ciúmes de que a búlgara ande de cama e pucarinho com um sérvio, f**a transtornado, insone, bate à porta do quarto de Diana, ela pede-lhe que saia dali, f**amos a saber mais pormenores sobre as máfias búlgaras, que em 1945 os comunistas búlgaros eram uma miserável minoria e que o Exército Vermelho matara cerca de cem políticos de topo e 30 mil letrados, que a vida na Bulgária é uma desgraça, paira uma atmosfera de terror e corrupção. Mais adiante, Diana confessa que está amorosa de Paulo. Diana fora chantageada, Paulo e K**a m***am uma operação e vira-se o feitiço contra o feiticeiro, simula-se um desastre, acabou-se com a raça do chantagista.

Prosseguem as aulas, discussões animadas, os alunos entusiasmados. O contrato de Paulo como professor cooperante no Lubango acaba. O retrato traçado dos outros cooperantes é de gente medíocre, dissoluta, revolucionários da treta. Diana e Paulo passeiam-se em Luanda antes do regresso deste a Portugal começa a alcoolizar-se, comprou um jipe, acompanhado do seu amigo Manel viajam até à Bulgária, de regresso a Portugal tem um grave desastre. Acaba a primeira parte do livro que se intitula Paixão e Premonições de Diana Sotirova. Começa agora o Longo Braço do Passado, Paulo regressa ao ensino universitário como assistente na UAPorto, é responsável por cadeiras de literatura anglo-americana, a paixão por Diana foi docemente esfriando, anda na estúrdia com Manel, Iza é muito compreensiva. Recebe um convite da embaixada dos EUA em Lisboa para uma longa visita ao país, anota no diário as suas impressões, regressa a Lisboa para visitar um amigo agonizantes no Curry Cabral. O avô deixa-lhe em testamento um terreno, a Catrina, investe metade do que recebeu com a venda da Catrina numa empresa do irmão. Paulo é novamente demolidor com o que se ensina no departamento, sente-se humilhado por lhe terem retirado uma cadeira do ensino, acompanha a mulher e vão ensinar na Alemanha, é aqui que se vai doutorar em literatura portuguesa, em Camões, estabelece boa relação com o professor Horst Feldmann, “alto, moreno, possante, meio careca, muito peludo, tinha mãos de pedreiro e tufos de pelos nas orelhas. Tinha uma belida sobre o olho esquerdo. Estava mal vestido, com uma confusão de cores, e usava sapatos já cambados. O aspeto grosseiro e a voz grossa contrastavam com o gabinete limpíssimo, todo vidro, aço e paredes de granito sem reboco. Paulo prepara afanosamente o seu doutoramento, vive em Aachen, cidade pacata, a tese é provada com brilhantismo, Iza e Paulo partem para umas férias onde não faltam bons hotéis.

Regresso ao Porto, Iza segue para Heidelberg, Paulo vai para Lisboa, novamente para o ensino universitário, novas amizades, mas no meio onde há aulas também há gente detestável, dedica-se com paixão a ensinar o romance português contemporâneo e também Camões. Segue-se a organização de congressos sobre a guerra colonial, faz amizades com militares ilustres, envolve-se num processo de candidatura para reitor, é bem-sucedido. Surge então um novo caso de chantagem, desta vez envolvendo-o pessoalmente, segue-se a operação Bumerangue, vai até Bissau, é aí que finaliza a perseguição de Ivan Dimitrov, que começara em Angola. Paulo volta para o Porto, está em pleno gozo da reforma, novas viagens, bons hotéis e excelentes itinerários. Paulo recorda a importância que Diana Sotirova tivera para ele. Agora com Iza forma uma dupla inexpugnável, inexplicável.

Uma movimentada literatura de entretenimento com Rui de Azevedo Teixeira transfigurado em Paulo de Trava Lobo. Falta agora conhecer o seguimento desta série de aventuras de um homem de Letras.

Desfazer mitos na cozinha e na segurança alimentarMário Beja SantosA Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) p...
17/12/2024

Desfazer mitos na cozinha e na segurança alimentar

Mário Beja Santos

A Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) produziu uma excelente publicação destinada tanto a profissionais de alimentação como, tendencialmente, consumidores, que merece relevo, mais a mais é possível extrair o PDF na internet (https://www.cncda.gov.pt/images/DocumentosLegislacao/Orientacoes_Manuais_e_Esclarecimentos/100MITOSV5FINAL.pdf).

Qual a finalidade de À Mesa: 100 Mitos? Tendo aumentado a curiosidade pelos regimes alimentares pautados em equilíbrio na saúde, o gosto por produtos tradicionais, a proliferação de eventos gastronómicos e até confrarias, destacando-se chefes de cozinha que ganham renome internacional, proliferando as publicações e os livros que atraem gastrónomos e gastrófilos, a par deste fenómeno social surgem e constroem-se crenças e formam-se convicções, muitas vezes, não tem qualquer fundamento científico, técnico ou legal. Um número impressivo dessas crenças e convicções podem colidir com a segurança alimentar, daí o grande interesse em desm***ar rumores e preconceitos, que numa vertente mais diretamente orientada para o consumidor tem a ver com matérias como estas: é permitido o uso de colheres de pau nas cozinhas (não existe qualquer legislação que proíba o seu uso, desde que se encontre em adequado estado de conservação; pela sua natureza, a colher de pau poderá degradar-se, apresentando poros e fissuras, pelo que o seu estado de conservação deverá merecer todo o cuidado por quem cozinha; sim, é permitido confecionar em casa doces e compotas para colocação no mercado, é uma atividade que está abrangida pelos requisitos relativos à higiene e rotulagem dos géneros alimentícios, aos materiais e objetos destinados a entrar em contacto com os alimentos; sim, nos estabelecimentos de restauração é proibido o encaminhamento de restos de cozinha e mesa para alimentação de animais de criação; sim, é proibida a presença de animais de companhia, pertencentes ao consumidor, no interior dos estabelecimentos, há casos excecionais como as pessoas invisuais; sim, o óleo utilizado para fritar batatas, depois de usado, poderá ser aproveitado para fritar peixe; deve ser dado preferência à utilização de óleos específicos para fritura, cuja temperatura de degradação é mais elevada; sim, é permitido o arrefecimento de alimentos (será o caso do arroz doce ou do leite creme) na bancada de cozinha e não no processo de refrigeração, contudo, é aconselhável que o processo de arrefecimento dos alimentos seja rápido e seguro; sim, é proibido o fornecimento de peixe proveniente da pesca lúdica a restaurantes; sim, é proibido vender vinho em garrafa não rotulada, a legislação é clara, impõem-se cumprir as regras relativas à designação, apresentação e rotulagem; sim, é benéfico para a saúde ingerir carnes vermelhas, são importantes para o regime alimentar, para além dos aminoácidos fundamentais para o bom funcionamento do sistema imunitário, são ricas em ferro e contêm doses elevadas de compostos bioativos; sim, é permitida a venda de bolas de Berlim ou outros produtos de pastelaria similares na praia; quanto a ser proibido vender géneros alimentícios com validade expirada, depende do género alimentício; na rotulagem é mencionada uma das duas expressões relativas à data de durabilidade: a “data limite de consumo” que tem a ver com os alimentos muito perecíveis (caso do leite, da carne ou do peixe fresco) e nestes casos aparece a menção “consumir até…”; bem como a “data de durabilidade mínima”, aplicável aos produtos alimentares pouco perecíveis; sim, é verdade que podem ser adicionados sulfitos aos géneros alimentícios mas apenas nas quantidades em que a legislação o autoriza; sim, é verdade que os géneros alimentícios biológicos podem ser produzidos recorrendo à utilização de pesticidas, apenas em casos em que não existem outras alternativas no combate aos inimigos das culturas.

Como o leitor pode verif**ar trata-se de uma publicação que primordialmente interessa à hotelaria, restauração e similares, igualmente às indústrias agroalimentares, mas os consumidores têm tudo a ganhar em ler À Mesa: 100 Mitos, é só descarregar o PDF.

Os desastres da guerra e do amor, fidelidade e desilusão políticaMário Beja SantosLogo f**amos a saber que é um foragido...
16/12/2024

Os desastres da guerra e do amor, fidelidade e desilusão política

Mário Beja Santos

Logo f**amos a saber que é um foragido, saberemos depois que conheceu as crueldades da guerra, será sempre uma guerra indeterminada, reencaminha-se, na sua deserção, para os locais da sua origem, aparece-nos literalmente exausto, emporcalhado, numa natureza áspera, em que a m***anha rumoreja, o vento atravessa os cumes, desce para a comba e vibra entre os arbustos, a sua ânsia é chegar ao casebre que o protegerá como na infância.

E saltamos para outra história, estamos em Berlim, no dia 11 de setembro de 2001, num cruzeiro de nome Beethoven, ali decorrerá uma conferência, as Jornadas Paul Heudeber, um famosíssimo matemático alemão, desaparecido em 1995, não se sabe se por acidente ou suicídio. Este matemático vivia na Berlim da RDA, por inteira convicção política, a sua amada, Maja, vivia em Bona, trabalha junto de W***y Brandt, o chanceler social-democrata. A correspondência entre as duas Alemanhas é de uma extrema beleza: “És o selo de tudo, única. O teu afastamento aproxima o infinito. Só tu me permites escapar ao tempo, ao mal, aos fluxos da melancolia.” Somos apresentados aos participantes do evento científico, sempre no rio Havel, para ele convergem alguns dos nomes mais sonantes da matemática à escala mundial. Voltamos ao desertor, ele caminha no rumorejar obsessivo da m***anha, lá em cima as manchas pretas dos aviões que descarregam bombas em terras longínquas, o mar não está longe, está sedento e esfaimado, a barba é rude como a casca da árvore, passou por um desfiladeiro, a casa está ali em baixo, à direita. Assim arranca este espantoso romance intitulado Desertar, por Mathias Enard, Prémio Goncourt 2015, Publicações Dom Quixote, 2024.

Mudamos de tempo e lugar, em 2021 a guerra parece próxima, entra em cena Irina, filha de Maja e Paul, nasceu em 1951, a RDA acabava de cumprir dois anos. Paul ganha notoriedade internacional com a sua obra As Conjeturas do Ettersberg, escrito acerca da sua detenção no campo de concentração de Buchenwald, o livro deu a volta ao mundo, terá sido a única obra de matemática com a categoria de bestseller. Parece caber a Irina a missão de revelar ao leitor o amor de Maja e Paul, compete-lhe procurar interpretar esse tempo da ascensão do n***smo até ai colapso dos estados comunistas e por onde pairou a paixão ardente daquele casal onde o amor aplacava as dissidências políticas.

O desertor mata a sede, lava o corpo em água gelada, chega uma intrusa com um b***o, vão começar as vicissitudes de dois sobreviventes. Voltamos às jornadas no Havel, Irina dá-nos conta das convicções do seu pai, acreditava piamente na agonia do imperialismo, escrevendo mesmo a Maja: “Berlim Ocidental é um prego na sola do sapato de Khrushchov. Prefiro pensar com orgulho que o socialismo mostra a cada dia a força desse coração, o poder dessa Europa, e que, em breve, será essa poça de capitalismo que é Berlim Ocidental que irá secar sozinha. Desertor e a recém-chegada e o b***o ali estão, na solidão da m***anha, o desertor ainda pensou em usar a arma, agora medem-se, algo os irmana, “a guerra fez tudo voltar ao zero, apagou tudo aplainou tudo limou tudo, os automóveis calcinados nas valetas das estradas os aviões manchas no poente um zumbido um assobio e tudo arde nos gritos da derrota.” Voltando à correspondência amorosa, Paul escreve a Maja em 1961, chegou o muro de Berlim: “Construímos uma barricada contra o fascismo. Em betão e numa noite. Ou pouco mais. Agora somos grandes e invencíveis – claro, o lado ocidental está cercado e vencido. Tudo depende da forma como considerarmos este conjunto; o princípio do infinito é que este contenha sempre uma quantidade maior.” E de novo nas jornadas, Maja está flamante, isto a par de uma chuva diluviana que caiu para os lados daquela m***anha em que o desertor e a sobrevivente se irão confrontar. A memória de Irina é imparável, recorda-nos a história da matemática, o entusiasmo do pai pelo socialismo que ele pensa que está a ser instaurado na RDA. Lá para aquela m***anha perto da Rocha Negra, o desertor trata da sobrevivente, e a memória de Irina faz-nos cair em cheio em Buchenwald, pelas cartas amorosas iremos também saber que fugiram aos n***s, encontraram acolhimento em Liège, a Gestapo recambiou-os para a Alemanha, o desertor trata carinhosamente a sobrevivente, na correspondência amorosa Paul escreve: “Maja meu amor venceremos, temos a força do círculo, a do triângulo retângulo sem o qual não existe o círculo, sólidos como dois anéis um dentro do outro, a invariância do campo da paixão. Mando esta carta para Norte. Enfio-me dentro dela como um génio na lâmpada. Se sussurrares abracadabra com carinho e esfregares o papel muito devagar contra o peito, eu apareço.”

Um acontecimento histórico deita for terra a realização das jornadas no rio Havel, a televisão mostra as imagens de um avião a despenhar-se numa nuvem de fogo, corpos a cair das janelas, as Torres Gémeas desmoronam-se, à volta da mesa os cientistas falam do que aconteceu na Europa, há uma instabilidade que se avizinha, um tanto indefinível. O desertor pensa partir sozinho, hesita, ir-se embora abandonando-a indefesa e tão doente em matá-la. E naquele dia de setembro de 2011, percorremos um tanto a história da Europa e a história da matemática, há até um estranho participante nas jornadas, de nome Isidro Baza que conta publicamente como Paul e ele viveram aqueles anos 1940.

Desertor e sobrevivente e um b***o muito doente encaminham-se para uma fronteira próxima, observam o despenhadeiro da Rocha Negra. Destes dois caminheiros sabemos que ele acendeu uma fogueira, colocou pedras planas e preparou uma fogueira para preparar as trutas que apanhou no rio, a sobrevivente está agitada, ainda desconfia do desertor e até lhe passa pela cabeça matá-lo.

Agora há lembranças de 1995, quando a guerra chegou ao fim na Bósnia, onde Paul morreu afogado aos 77 anos. De Nova Iorque, um ilustre matemático que comparecera às jornadas do rio Havel, Linden S. Pawley escreve a Irina, estamos em maio de 2012, carta confessional, ele e Maja tinham tido uma relação ocasional, volta ao passado, há fuga para a Bélgica em maio de 1940, eles fugitivos, há uma denúncia, segue-se Buchenwald. “Querida Irina, não me julgues. Não nos julgues. Achei importante escrever-te, antes de tudo acabar no esquecimento.” Temos agora uma carta de Paul envelhecido: “Maja, meu amor. A matemática é um véu pousado sobre o mundo, que se ajusta às formas do mundo, para o envolver completamente; é uma linguagem e é uma matérias, palavras numa mão, lábios num ombro; a matemática arranca-se como um gesto rápido: podemos ver então a realidade do universo, podemos acaricia-la como o gesso dos moldes, com as asperezas, as saliências, as linhas, sejam elas de fuga ou de vida. Esse véu, essa toalha sobre o mundo, também é a mortalha na qual me envolvo quando chega a hora de ir embora.”

É neste carrossel de múltiplos tempos e lugares que Irina vai a caminho de Ettersburg, perto de Weimar, é nisto que aqueles fugitivos se deparam com três soldados, há quem queira abusar da sobrevivente, no desespero ela espeta-lhe uma agulha no olho, estamos já em 2021, há bombardeamentos russos na Rússia, Irina imagina o seu pai a escrever uma parte da sua obra em Buchenwald.

É uma obra prodigiosa, talvez uma metáfora sobre as diferentes guerras que endemoninham a Europa, é uma escrita esplendente de um escritor cultíssimo, e é preciso ter muito talento para gerar esta tensão no leitor com a história justaposta de dois destinos aparentemente sem relação um com o outro.

Angola, 1961, começou a defesa do Império:Documentação e análise de um rigor dificilmente atingível por um só investigad...
11/12/2024

Angola, 1961, começou a defesa do Império:
Documentação e análise de um rigor dificilmente atingível por um só investigador

Mário Beja Santos

O historiador Valentim Alexandre dá-nos conta neste seu trabalho de arromba o propósito da obra: “Sendo totalmente autónomo, este livro inscreve-se num projeto mais vasto, que visa fazer o estudo da última fase do colonialismo português. Noutro volume, intitulado Contra o Vento, seguimos a evolução do Império, após a Segunda Guerra Mundial, até 1960 – um período caracterizado pelo movimento de descolonização que, com incidência primeiro na Ásia e depois em África, levou à desagregação dos sistemas coloniais europeus. A exceção foi Portugal, que tomou nesta fase um rumo divergente, resistindo aos ‘ventos de mudança’. O livro depois publicado – Os Desastres da Guerra – Portugal e as Revoltas em Angola (1961 – janeiro a abril) – tem como centro a análise das três convulsões que, em começos de 1961, em zonas geográf**as diferentes, abalaram o domínio colonial em Angola – a revolta da Baixa de Cassange, de janeiro a março; o assalto às prisões de Luanda, em fevereiro; e a insurreição no norte do território, a partir de 15 de março – assim como das suas repercussões em Angola e na metrópole. O presente volume retoma o fio dessa meada em que, a 13 de abril, o Presidente do Conselho, Oliveira Salazar, vencido o golpe de Estado conhecido por Abrilada, assumiu a pasta da Defesa, fazendo-se desde então a mobilização do contingente geral do Exército para combater a insurreição angolana.”

Nesse dia 13 de abril, Salazar dera início à remodelação governamental, num breve discurso anuncia que se irá avançar para Angola, rapidamente e em força. A opinião pública ignora que houve uma tentativa de golpe de Estado, quem promovia alterar o curso dos acontecimentos era um movimento encabeçado pelo próprio ministro da Defesa, Botelho Moniz, escrevera-se a Salazar uma carta, falava-se em situação angustiosa e em breve insustentável das Forças Armadas, havia que restituir ao país as liberdades essenciais, entre outros argumentos. O ditador não desconhece que há sinais de ebulição nas colónias africanas, a Guiné está cercada de países independentes, o Congo deixou de ser belga, há crise na Federação das Rodésias e da Niassalândia, os efetivos militares portugueses são mínimos, mas outras colónias conhecem surtos nacionalistas e há pressões para a sua anexação no Estado da Índia. Adriano Moreira é o novo ministro do Ultramar, é nesse período dramático que ele se dirige a Angola, percorre as zonas em turbilhão, discursa, anuncia reformas, publica diplomas, não são medidas de fundo, e o ministro sabe perfeitamente que não pode contar com grandes aberturas por parte de Salazar, a rutura virá no ano seguinte.

Reocupa-se em termos militares o norte de Angola, os primeiros batalhões e outros contingentes são deslocados para os locais onde houvera massacres, e onde os próprios angolanos tinham fugido face às atrocidades da UPA, que, demonstradamente, não trazia preparação para lutar em termos de guerrilha. A questão angolana é analisada na ONU, o regime de Salazar descobre que nem os Estados Unidos estão do seu lado e há velhos aliados que se abstêm nas votações, a favor só se manifestam a África do Sul e a Espanha. A propaganda portuguesa exibe os massacres e m***a um discurso que ganhará perenidade: os terroristas vem de fora, são apoiados pelos comunistas, Portugal passou a estar na vanguarda da defesa do Ocidente. E, contudo, os velhos aliados continuam a fazer bons negócios e a dar ajudas a Portugal.

Valentim Alexandre disseca a essências das reformas, procura-se acabar com o trabalho forçado e com as monoculturas de entidades estrangeiras. Cedo se percebe que era necessário revogar o Estatuto do Indigenato, para ter um mínimo de credibilidade a nível internacional. Discute-se a integração económica do espaço português, o autor disseca o relacionamento da UPA com o MPLA (este ainda tinha um papel extremamente tímido na alvorada da luta armada e a UPA beneficiava de um melhor tratamento internacional, da Argélia aos Estados Unidos). É-nos também dado um mapeamento das forças partidárias envolvidas no conflito angolano e quais a suas linhas de clivagem. Regressamos Às fragilidades do Império português, no caso da Guiné, o PAIGC já está a preparar quadros, um movimento de manjacos ataca em S. Domingos, Susana e Varela e depois umas emboscadas (pratica atos de vandalismo e depois sai do teatro de guerra.

Tudo se adensa na cena internacional, o regime tem cada vez mais dificuldade de argumentação tanto junto da NATO como em Nova Iorque. Na cena interna, como observa o autor, “O P*P era a única força de oposição que tinha uma perspetiva anticolonial definida desde 1955, na sequência da crise de Goa. Nos anos seguintes, o P*P seguiu com grande atenção a questão colonial, a que dava um largo espaço no jornal Avante!, onde se denunciava a repressão exercida nas colónias. O P*P manteve a mesma linha, no essencial, em começos de 1961, após as rebeliões em Angola.” Anteriormente o autor dera-nos conta como o conceito imperial vincara o republicanismo e a oposição liberal ao Estado Novo aparecia ou a calar ou a consentir a defesa do Ultramar português, como se vira no ato eleitoral que ocorrera em 1961.

A síntese da obra neste volume de mais de quinhentas páginas dá-nos uma grande angular da natureza da resposta do regime, do tal quadro que condicionava a política colonial portuguesa e a dos anos de 1870, naquilo que mais tarde se irá chamar o Terceiro Império, a saga africana, um lastro histórico que Valentim Alexandre aprecia numa escrita luminosa, abrindo caminho para o que se segue, a questão da reforma do regime colonial português, o ditador é fortemente centralizador e há os defensores da gradual autonomia, isto é, as relações políticas entre as diversas parcelas do Império. “Adiada em 1961, pela premência que a insurreição no norte de Angola criava, a questão eclodirá no ano seguinte, num debate tumultuoso, que culminará em outubro numa célebre reunião plenária do Conselho Ultramarino. No campo das relações económicas deu-se um passo importante na via de criação do ‘espaço económico português’ tendente a estabelecer a livre circulação de mercadorias de origem nacional entre os vários territórios.”

É impressionante o trabalho deste historiador que lançou mãos a algo que só é imaginável nas mãos de uma farta equipa – parece que estamos a acompanhar mês a mês, com o pano de fundo da maré anticolonial (1945-1960), as vicissitudes do fim do Império, com uma ordem de trabalhos e um rigor inatacáveis.
De leitura obrigatória.

Parasitoses intestinais nas crianças: como se manifestam, como se tratamMário Beja SantosÉ provável que nunca tenha ouvi...
07/11/2024

Parasitoses intestinais nas crianças: como se manifestam, como se tratam

Mário Beja Santos

É provável que nunca tenha ouvido falar em ascaridíase, teníase, amebíase, giardíase e oxiuríases: são infeções causadas por parasitas que podem aparecer nos intestinos das crianças e dos adultos. O problema das parasitoses ainda persiste, mas já não é um problema preocupante de saúde pública. Contudo, a sua prevenção e controlo não deixa de ser importante.

A vulnerabilidade do organismo da criança leva-nos a compreender que devemos estar atentos aos sinais e sintomas destes parasitas.

É fundamental reter que estes parasitas se instalam no intestino, onde depositam os seus ovos, e se disseminam, por hipótese, através das mãos, dos brinquedos e de outros elementos de uso quotidianos que possam estar contaminados. Há sinais de alerta da manifestação das parasitoses: é o caso da comichão no â**s, por alterações como distúrbios gastrointestinais, gases e inchaço, e fadiga e perda de peso devido ao facto dos parasitas se alimentarem dos nutrientes provenientes da alimentação da criança. Os pais e encarregados de educação devem estar atentos sempre que ocorra uma destas manifestações, sendo importante a observação das fezes.

A higiene é um dado adquirido. Havendo animais domésticos, é essencial ter cuidados especiais, como desparasitar regularmente os cães ou gatos; lavar sistematicamente as mãos das crianças após terem tocado no animal; a higiene da casa é também importante, sendo recomendável a lavagem da roupa a temperaturas elevadas.

Diagnosticada a parasitose, prescreve-se um medicamento antiparasitário, recomenda-se o consumo de alimentos ricos em fibra. Atualmente há antiparasitários não sujeitos a receita médica, converse com o seu farmacêutico, ele deve disponibilizar-lhe toda a informação relativa ao uso correto do medicamento, e sobretudo conhecer outra medicação que a criança está a fazer.

Dependência digital, uma patologia das redes sociais que se impõe alertarMário Beja SantosO livro Dependência Digital, d...
07/11/2024

Dependência digital, uma patologia das redes sociais que se impõe alertar

Mário Beja Santos

O livro Dependência Digital, de Pedro Prostes da Fonseca, Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2024, que se revela uma aprimorada obra de divulgação, lembra-nos que o mundo vive hoje colado aos ecrãs (computadores, tablets, iPads ou smartphones) e a exposição a estas tecnologias e seus conteúdos é suscetível de produzir dependentes digitais. Enviam-se sérias advertências para a geração Z e a todos aqueles que estão extremamente vulneráveis à dependência digital.

O primeiro alerta tem a ver com as posturas e nelas permanecer durante horas, situações que podem acarretar dores lombares, tendinites, epicondilites, isto para não falar em casos mais sérios. E fazem-se recomendações para uma boa postura, incluindo exercícios para as mãos, são indispensáveis atitudes positivas em relação à boa saúde.

Estima-se que mais de 3,5 mil milhões de pessoas jogam com regularidade videojogos, de crianças a adultos. Daí a necessidade da prevenção desde tenra idade. Uns autores citados, é Catherine L’Ecuyer, afirma que muitos erros foram cometidos desde aparecimento das tecnologias. Facilitar o uso destas em crianças em idades precoces foi um deles: “Se as crianças forem expostas a um ecrã antes dos três anos, não serão capazes de transpor uma imagem a duas dimensões para o mundo tridimensional.” E, mais adiante: “A criança é bombardeada com estímulos porque se presume que se não for estimulada não vai, digamos, aprender a andar, o que não é verdade. Maria Montessori (pedagoga italiana) dizia que fazer pela criança o que seria ela a fazer é substituir-se a ela, ou seja, é cancelá-la.” A preocupação dominante é um uso saudável das tecnologias, e sempre com o foco na saúde mental.

O autor analisa os videojogos na adolescência e levanta a questão de que é indispensável envolver o adolescente na procura de soluções, a realidade familiar é parte integrante, há que encontrar soluções para reduzir o tempo de exposição, substituindo-o por tempo de qualidade em família, por uma vida de relação com os outros, práticas de atividade física, etc.

As redes sociais virtuais, com o Facebook à frente têm forte atração de suscitar a criação de uma marca da nossa identidade pessoal, é uma imensa sala de conversa de representação no quotidiano, uma assembleia onde se pode fazer confissões, brigar, ter a ilusão da socialização digital igual ou superior à socialização presencial. Diz o autor que entre as causas mais conhecidas da dependência das redes sociais encontram-se a baixa autoestima, a insatisfação pessoal, a depressão ou hiperatividade e a falta de afeto, carência que os adolescentes tentam preencher através dos likes de forma quase compulsiva, para sentirem uma intensa sensação de satisfação.

Leitura semelhante ou afim se poderá ter para a adição aos videojogos como um comportamento para aliviar emoções complicadas, gera-se a ilusão de que aquela popularidade na internet extravasa para o mundo real. As dependências ao videojogo e às redes sociais constituem duas realidades diferentes. As redes vividas num quadro de compulsão estão associadas ao medo de se manter fora do que está a acontecer, e daí o smartphone ser considerado uma espécie de extensão do próprio corpo; não são de excluir potenciais perigos de desajustes emocionais no quadro da dependência das redes; o videojogo pode ter outra natureza: acreditar na sorte, ter a ilusão que essa mesma sorte irá premiar o êxito, sobretudo o material. Quando a dependência é intensa pode entrar-se em atividades de risco, é o caso das apostas desportivas online. Recorda o autor que o pano social de fundo favorece a pressão, vem de fora do mundo digital: “Hoje, serão, pelo menos, centenas as equipas de futebol patrocinadas por casas de apostas, e o número não para de crescer. Isto apesar de alguns países, como a França, a Itália, a Dinamarca ou a Espanha, terem promulgado legislação que proíbe a publicidade a empresas de apostas nas camisolas das equipas. Em Portugal não existe esta interdição, e o resultado é que 12 das 18 equipas da primeira divisão exibem nas suas camisolas o nome de casas de apostas que também patrocinam a Liga (Betclic) e a Taça de Portugal (Placard). O fortíssimo investimento das casas de apostas nos clubes de futebol não surge como um mero acaso. Estudos demonstram como os adeptos desportivos se sentem ligados aos patrocinadores dos seus clubes de futebol, conferindo confiança a estas marcas.”

Falando dos jogos de fortuna ou azar, acrescenta o autor que somavam, em 2022, um volume total de mais de 9 mil milhões de euros, qualquer coisa como 31 milhões de euros por dia. Portugal tem 15 operadoras de jogo online licenciadas, a previsão é que este número aumente; há cerca de 1 milhão de pessoas registadas em operadoras de jogo online licenciadas. A imaginação dos agentes do mercado é transbordante. E põem-se problemas que se prendem com a proteção do consumidor. Em 2022, a DECO e outras associações de 18 países expressaram em comunicado o perigo de manipulação e exploração dos consumidores dos “pacotes misteriosos”, as loot boxes, criadas pela indústria dos videojogos, exigiram uma regulação deste setor. A DECO considera que as loot boxes dos videojogos têm um design manipulador, fazem marketing agressivo e apresentação probabilidades enganosas: “Prejudicam gravemente os direitos e interesses dos consumidores, sobretudo dos mais vulneráveis, quer via mecanismos predatórios, quer promovendo o vício de jogo, visando sempre e somente o seu lucro.”

É intensa a procura das “caixas de recompensa” que se pode explicar como uma combinação de psicologia, design inteligente e fraqueza humana pela gratif**ação instantânea – é o mesmo desejo que leva as pessoas a comprar bilhetes de lotaria ou a raspadinha, tem a ver com a emoção de potencialmente se ganhar dinheiro com pouco investimento, é uma atração irresistível. O autor refere também as microtransações, um sistema polémico que aguarda enquadramento legal.

Age-se preventivamente ou procura-se a resposta adequada quando a dependência se instala. A função educativa é primordial, o apoio psicológico poderá revelar-se indispensável. Um psicólogo explica que uma das características dos indivíduos com dependência é o não reconhecimento do seu problema. “Compete ao técnico, numa ação conjunta com os pais ou os amigos de quem sofre da dependência, elaborar estratégias que conduzam a uma consciencialização e a uma mudança de estilo de vida, em função das características de personalidade e de idade de quem vive ao transtorno.” E elencam-se estratégias que podem propiciar o tratamento da dependência digital: não usar o telemóvel quando se está na companhia de outras pessoas; desativar as notif**ações automáticas; reduzir o número de amigos nas redes sociais; eliminar aplicativos e abandonar grupos do WhatsApp prescindíveis, etc.

Leitura muito útil que não se circunscreve aos leitores da geração Z.

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