16/08/2024
Entrevista com o cônsul italiano
Valerio Caruso
Por Themis Pereira de Souza Vianna
A arte de escrever requer contato profundo com o tema. Exige paciência e dedicação ao assunto. Pede nossa entrega total, como um devoto se entrega a um santo. Só escrevemos bem a partir do momento em que a matéria envolve nossa sensibilidade. O reino encantado das belas palavras é exigente e pede pedaços da alma.
Meu novo livro é assim, ele pede a imersão dos meus sentidos, para dar vida ao título “Meu pequeno lado italiano”. Esse frágil fiapo que me liga a alguns antepassados que vieram da Itália é que turbina dentro de mim a ansiedade por mais dados. Desperta a vontade de estudar e percorrer lugares por onde eles caminharam. De alimentar o espírito nessa viagem no tempo e traduzir esse percurso com a palavra escrita.
No afã da procura eu obtive a resposta do Cônsul Geral para o Rio Grande do Sul, Valerio Caruso, que me esperaria às 11 h no dia 13 de agosto, uma terça-feira, para falar sobre os italianos em geral e sobre os italianos neste Estado.
Chegou o dia, chegou a hora, chegou o momento da entrevista. Eu estava ali, muito bem recebida por um jovem elegantemente vestido com um terno de boa grife. Nada mais, nada menos do que o cônsul, 35 anos, vindo há pouco tempo diretamente da Itália. Ao começar a falar com sotaque ainda forte, passei a vê-lo como uma fonte original para o meu livro. Uma fonte viva da cidade de Modena, da região de Emília-Romagna, terra natal de Enzo Ferrari, Luciano Pavarotti e Mirela Freni (uma das cantoras líricas favoritas do maestro Herbert von Karajan).
Estava um pouco nervosa por me encontrar dentro de um consulado, ambiente protocolar, geralmente formal e sisudo. Mas as nuvens pesadas sobre o meu horizonte logo se dissiparam, quando o cônsul se mostrou solícito e disposto a responder minhas perguntas.
O dia que eu precisar deixar Porto Alegre e o Rio Grande do Sul será muito triste para mim — disse Valerio Caruso, iniciando a conversa.
— Eu cheguei aqui receoso, mas fui tão bem acolhido pelos ítalo-gaúchos, que, já na primeira impressão do local, os meus temores se desfizeram. Senti que eles têm um apreço muito grande pela sua origem italiana e dentro desse sentimento me acolhiam com bastante ternura. Logo procurei adaptar-me à língua local, uma das prerrogativas do meu ofício, pois vim para cá para representar o meu país e ajudar os seus descendentes aqui radicados, oferecendo-lhes compartilhamento cultural com sua etnia de origem — disse o cônsul.
Nesta altura eu já não me sentia do “outro lado do balcão”, como diziam os antigos. Estava entrando na faixa de sintonia com meu assunto. Pensei comigo: o cônsul realmente gosta do trabalho e do Rio Grande do Sul. Assumiu o consulado com senso de honra. Valerio Caruso parecia estar escalado numa missão que muitos não queriam aceitar. Aí lembrei aquela foto ele com a metade do corpo tomada pela enchente do Guaíba e a sua sede consular com meia parede alagada. Uma foto de arrojo, de ação e de testemunho sobre o que estava acontecendo no prédio consular em Porto Alegre. Pairava em torno dele uma força latente cheia de realismo e disposição a enfrentar os desafios da natureza e de sua missão no Brasil.
— Decidi conhecer os ítalo-gaúchos — disse. — Comecei a percorrer algumas das principais cidades da antiga colonização italiana. Entre elas, destaco a maior, Caxias do Sul. Hoje ela é um polo industrial e um centro da cultura italiana no Estado. Fiquei surpreso com as cidades como Farroupilha, Bento Gonçalves, Garribaldi, Carlos Barbosa, Passo Fundo, Erechim. Todas com amplo predomínio de descendentes de imigrantes italianos. Nessas passagens fiquei emocionado com o imenso carinho das pessoas. Elas são impressionantes. Afetivas. Uma imagem que não temos na Itália de nossos descendentes aqui no Rio Grande do Sul. Eles precisam conhecer estes locais. Precisam ir ao interior e vê-los, ouvi-los, sentir o cheiro da terra, das árvores, do ar. testemunhando isso com entusiasmo. Valerio observou — Cheguei a experimentar os vinhos aqui produzidos e acho que eles precisam ser difundidos. São muito bons. Alguns são melhores como nossos de lá. Acho que nos cabe testemunhar esse lado positivo, mas desconhecido. Precisamos promover as regiões que visitei. Dar-lhe a devida importância. E trazer turistas italianos para conhecer e depois levar a experiência à Itália — concluiu o cônsul com muito entusiasmo.
Notei em suas palavras o seu ardor para dar o melhor de si à missão que lhe foi dada. Demonstrava uma admiração apaixonada pelos ítalos-gaúchos. Não cansou de elogiar o carinho que recebe dessa gente com raízes italianas radicadas no Rio Grande do Sul.
Não poderia ser diferente. Os bons resultados estão acenando. Li elogios na imprensa sobre o seu ímpeto por melhorar e agilizar os serviços consulares à população. Desburocratizou setores emperrados, acelerando com a implementação de mais recursos tecnológicos. A gestão também levou a um aumento no número de novas cidadanias reconhecidas por direito de sangue e por casamento. Em outra reportagem consta este título: “Consulado italiano no RS quebra recorde de emissão de passaportes Total foi de 13 mil, média de 1,1 mil ao mês em 2023”.
Concluo com um final feliz sobre o resultado da minha entrevista. Por ter conhecido um grande ser humano, competente e prestando bons serviços. E o meu fecho de ouro para essa crônica é comunicar que o Cônsul-Geral da Itália aceitou o convite para prefaciar o meu livro cujo título é Il Mio Piccolo Mondo Italiano.