20/11/2021
João e o Natal
O pequeno João e sua mãe moravam em uma pequena casa de madeira rústica. Era uma residência bem humilde. João era uma criança entre a infância e a adolescência. João nunca conheceu o seu pai. A mãe de João, Marta, era uma jovem senhora de 30 anos de idade. Suas vidas eram de muitas dificuldades. Marta não tinha emprego e ambos viviam de pequenos trabalhos executados por ela.
Este ano, como todos os outros, foi realmente de muitas dificuldades.
Enfim, chegou o Natal. João e Marta nunca tiveram, juntos, de verdade, um Natal. João nunca ganhou um brinquedo em sua vida. E como a vida o ensinou, ele não se importava com brinquedos ou com o Natal. Era como sua mãe sempre lhe dizia: o importante, meu filho, é a gente sobreviver.
Marta, havia muito tempo, não tinha contato com seus parentes. Assim, os dois eram duas pessoas sozinhas no mundo.
No bairro pobre onde moravam, talvez pelas dificuldades, poucos comemoravam as festas de final de ano.
Então, na noite de Natal, como de costume, Marta, com o coração cheio de tristezas, recolheu-se cedo para dormir. Antes de se recolher, ela olhou para o seu filho João e, sem que ele percebesse, passou a chorar. Mas João percebeu o choro contido de sua mãe. João também chegou a lagrimar.
Era quase meia-noite e João abriu a porta e sentou-se na frente de sua casa. Era uma fria noite de Natal e havia pouca movimentação naquela rua. A pobreza naquela parte da cidade era bem visível.
Inesperadamente, por volta da meia-noite, um automóvel parou na frente da casa de João. Este ficou assustado e ao mesmo tempo surpreso com aquela situação.
A porta traseira do veículo se abriu e João viu a figura de um Papai Noel. O "velhinho" saltou do carro e caminhou na direção de João. Não havia praticamente ninguém na rua. O visitante desejou Feliz Natal a João. Este, meio confuso, meio assustado, retribuiu o cumprimento. O Papai Noel sentou-se ao lado de João e perguntou: "Você já ganhou seu presente de Natal?" João, com indiferença no olhar, balançou a cabeça negativamente. O Papai Noel então disse: "Eu vim para lhe dar um presente. Presente que já deveria ter-lhe dado em outras ocasiões, em outros natais, mas agora eu pretendo consertar essa minha grave falha."
João não entendeu as palavras do Papai Noel mas perguntou: "O Senhor já deu o presente das outras crianças desta rua?"
O Papai Noel respondeu: "Não conheço nenhuma criança desta rua, só conheço você."
João então disse: "Eu não me importo com presentes. Só queria mesmo é que todas as crianças aqui da rua recebessem, pelo menos, um carrinho ou uma bonequinha."
O Papai Noel olhou no rosto de João e disse: "Caramba, você é um pequeno homem com um grande coração. Quisera eu poder ajudar todas as crianças comuns desta rua..."
João falou: "Não são crianças comuns. São meus amigos, são meus irmãozinhos."
O Papai Noel disse: "Então desejo um Feliz Natal para os seus amigos também. Tenho outro compromisso. Vamos ao seu presente..."
João interferiu: "Não preciso de nenhum presente. Desculpe-me. Dê para outra criança."
O Papai Noel falou: "Não posso dar para outra criança. É um presente nominal. Está em seu nome. É para você. Aceite, por favor."
João olhou no rosto do Papai Noel e disse: "Tudo bem, vou aceitar o presente, mas posso dá-lo a outra criança?"
O Papai Noel disse: "O presente é seu. Pode fazer o que quiser com ele."
O Papai Noel voltou até o carro, abriu a porta traseira e tirou um pequeno pacote. Voltou para perto de João e lhe disse: "Aqui está o seu presente. Pegue-o. É de coração. Um presente maior eu lhe daria se assim eu pudesse."
O Papai Noel o abençoou e já ia embora, quando João perguntou: "O que tem neste pacote?"
O Papai Noel respondeu: "O seu presente."
João novamente perguntou: "Posso doá-lo a uma outra criança?"
O Papai Noel falou: "Pode fazer o que quiser com ele, o presente é seu, mas não é melhor abri-lo antes?"
João deu de ombros e, em seguida, abriu o pacote. Era uma embalagem muito bem feita e João levou alguns segundos para conseguir abrir. João se assustou ao ver que o presente não era um brinquedo. Era dinheiro. Uma certa quantia em dinheiro. Muito dinheiro.
João falou ao Papai Noel: "Não quero seu dinheiro..."
O Papai Noel disse-lhe: "Mas é o seu presente. É todo seu. Faça o que quiser com ele. E seja muito feliz..."
Rapidamente o Papai Noel voltou para o carro, entrou e foi-se embora.
João ficou olhando os brilhos, ao longe, dos fogos de Natal, e, em seguida, entrou em casa e acordou sua mãe.
João contou a Marta sobre o ocorrido e ela perguntou a João: "Como era esse Papai Noel?"
João respondeu: "Normal, como todos os outros que eu já vi."
Marta entendeu que João não estava entusiasmado e lhe indagou: "O que vai fazer com o dinheiro?"
João respondeu: "Não sei. Estamos com fome mas não quero dinheiro de ninguém. Além do mais, quantas crianças nesta rua não comeram nada o dia todo? Não seria justo a gente se empanturrar de comidas, bebidas e presentes, deixando as outras crianças na miséria. Não quero isso!"
Marta falou: "Meu Deus, você é mais inteligente e nobre do que eu pensava. E você está certo, meu filho, acho também que não seria justo passar um Natal no bem-bom enquanto seus amiguinhos estão morrendo de tristeza. Vou voltar a dormir. Vá dormir também e, pela manhã, você decide o que vai fazer.
Pela manhã, João levantou-se e viu que sua mãe já estava de pé. Marta desejou-lhe bom dia e perguntou se ele já havia tomado alguma decisão. João falou: "Mãe, contei o dinheiro. Tem cem mil reais no pacote."
Marta empalideceu.
João continuou: "Já sei o que vou fazer. Vou à loja de brinquedos, no Centro, e vou comprar brinquedos para todos os meus amigos..."
Marta falou: "Tudo bem, meu filho, mas hoje é dia 25 de dezembro. É feriado de Natal. As lojas estão todas fechadas. Só abrem amanhã."
João colocou o pacote de dinheiro em sua velha mochila e disse: "Vamos ao Centro verificar se tem alguma loja aberta. E eles foram.
Ao chegarem ao Centro, realmente, todo o "comércio" estava fechado. João, com sua mochila às costas, parou em frente a uma grande loja de brinquedos e, como que congelado, ficou olhando os brinquedos na vitrine. Marta entendeu o momento de seu filho e ficou esperando por ele, sentada em um banco ali próximo.
Alguns minutos depois apareceu um homem, que aproximou-se de João e perguntou-lhe: "O que o jovem rapaz deseja? A loja está fechada e só abrirá amanhã."
João falou: "Preciso comprar brinquedos para alguns amigos."
O homem falou: "Hoje não tem como. Só amanhã."
João perguntou: "O Senhor é o dono da loja?"
O homem respondeu: "Não, quem me dera. Eu trabalho para o dono. Faço a segurança da loja."
João perguntou: "Tem como o Senhor falar com ele?"
O homem respondeu: "Sim, mas somente se for uma emergência."
João falou: "Acho que é uma emergência. Meus amiguinhos estão muito tristes. Eles precisam ganhar pelo menos uma lembrancinha neste Natal."
O homem continuou a conversa: "Quantos amiguinhos você tem?"
João respondeu: "Não sei ao certo, mas acho que são uns trezentos ou mais. São crianças pobres da minha comunidade."
O homem então falou: "Desculpe a minha ousadia, mas de onde você tiraria dinheiro para comprar brinquedos para trezentas crianças? Além do mais, não há brinquedos baratos nesta loja. Por que você não volta amanhã e compra nos camelôs, é muito mais barato."
João falou: "Por favor, amigo, não me julgue pelas minhas roupas. Eu garanto ao Senhor que tenho dinheiro para comprar brinquedos nesta loja, para trezentas crianças ou mais. Só quero que o Senhor entre em contato com o dono da loja e eu farei negócio com ele."
O homem falou: "Meu amiguinho, aprecio a sua boa vontade, mas, pegue o seu dinheirinho e vá lanchar com sua mãe. Compre pipocas e sorvete. Você vai se sentir melhor."
João disse: "Meu bom amigo. Faça somente uma tentativa. Fale com o dono. Se ele disser que não vem fazer negócio comigo, eu prometo que vou embora."
O homem sentiu pena da ingenuidade de João e disse: "Tudo bem, vou ligar para o dono da loja..."
O rapaz da segurança realmente ligou para o proprietário da loja e este deu uma grande gargalhada ao ouvir a história, mas, logo em seguida, disse ao seu funcionário: "Diga ao rapazinho que estarei aí em vinte minutos."
De fato, um pouco mais de vinte minutos depois, o proprietário da loja chegou ao local e, ao ver João, não se entusiasmou muito, mas, apresentou-se a João e a Marta, deu-lhes apertos de mãos e perguntou a João o que ele realmente queria, achando que ele, João, estava querendo ganhar um brinquedo de graça, afinal, toda criança gosta de brinquedos.
João rapidamente lhe explicou porque estava ali, contando ao dono da loja, Seu Roberto, toda a sua trajetória de vida. Depois disso, João falou a Seu Roberto que realmente tinha cem mil reais e queria comprar tudo em brinquedos para seus amiguinhos.
Seu Roberto acreditou em toda a história de vida de João, menos na parte em que ele disse ter cem mil reais. Mesmo assim, em tom de brincadeira, Seu Roberto disse: "Por que ao invés de gastar seu dinheiro em brinquedos, você não compra um carro de verdade zerado para sua mãe, por exemplo?"
João respondeu: "O Papai Noel me deu o dinheiro. Como eu não tenho o costume de ganhar presentes e nem de comemorar o Natal, queria fazer o Natal dos meus amiguinhos mais feliz, só isso..."
Seu Roberto era uma homem de bem. Sorriu. Pegou as chaves em seu bolso e abriu a loja, acendeu as lâmpadas e disse a João: "Pois bem, meu amiguinho, a loja está à sua disposição. Escolha alguns brinquedos e pode levá-los para alguns de seus amiguinhos."
Foi então que João abriu sua mochila, tirou o pacote de dinheiro, colocou em cima do balcão, exibiu as notas e disse: "Aqui estão os cem mil reais. Vou pegar os brinquedos. Quando o Senhor somar e verificar que atingiu cem mil reais em brinquedos, eu paro."
Seu Roberto e o rapaz da segurança ficaram de queixo caído, sem nenhuma reação. Marta, que observara toda a negociação, falou a Seu Roberto: "Pode confiar. Tem realmente cem mil reais no pacote."
Seu Roberto perguntou a Marta: "Você conferiu o dinheiro?"
Marta disse: "Não, mas meu filho conferiu. Ele é muito inteligente. Como eu disse, pode confiar."
Seu Roberto falou para Marta: "Confira de novo o dinheiro, afinal, são cem mil reais. Não podemos nos enganar, não é mesmo?"
Marta, meio sem jeito, passou a conferir o dinheiro enquanto João escolhia os brinquedos.
Cerca de uma hora depois, João já tinha passado todos os brinquedos que escolhera pelo caixa, operado por Seu Roberto. Este, em seguida, falou a João que tinha atingido o total de cem mil reais. Neste momento, Marta também acabara de conferir o dinheiro. Ela então falou a Seu Roberto: "Aqui está o dinheiro. Realmente tem cem mil reais no pacote."
De supetão, sem nenhuma cerimônia, Seu Roberto falou para Marta: "Se tem cem mil reais no pacote, ponha-o em sua bolsa. O dinheiro é seu agora."
João, surpreso, com tristeza no rosto, perguntou a Seu Roberto: "E os brinquedos?"
Seu Roberto respondeu: "São seus também. Negócio fechado. Querem que eu chame um transporte para levar os brinquedos? O frete é por minha conta."
João, Marta e o rapaz da segurança ficaram boquiabertos, foi quando o João falou: "Não entendi!... O Senhor vai me dar os brinquedos de graça?"
Seu Roberto falou: "De graça?!..." E Seu Roberto continuou a falar: "Meu amiguinho, deixe-me lhe contar uma historinha... eu me criei nas ruas. Meu pai e minha mãe morreram quando eu era criança, bem criança mesmo. Como eu disse, eu me criei nas ruas. Assim como você, João, eu também nunca ganhei um brinquedo no Natal. Peguei sim foi muita porrada nas ruas. E pode acreditar, eu já vi de tudo nesta vida. Então, ao sentir na pele toda a maldade do mundo, eu deixei de acreditar em Deus. Agora imaginem vocês, eu me tornei uma criança que não acreditava em Deus..."
E Seu Roberto continuou: "Mas um dia, quando eu já tinha uns 14 anos, uma senhora me viu pegando restos de comida na lixeira de um restaurante. Nunca me importei com que as pessoas pensavam de mim, mas naquele dia, por algum motivo, fiquei com vergonha. A mulher baixou a cabeça e foi embora. Uns dias depois, eu fui novamente catar restos de comida na lixeira do mesmo restaurante, foi quando, para minha surpresa, aquela senhora estava lá, me esperando. Tentei fugir, mas ela gritou, chamando minha atenção. Eu parei e ela se aproximou. Ela me pediu desculpas e se apresentou. Perguntou meu nome e, logo em seguida, ela disse que tinha um presente para mim. Fiquei surpreso e muito envergonhado, afinal, nunca havia ganhado nada de ninguém na minha vida. Eu disse que não queria, seja lá o que fosse. Ela insistiu e eu tive que aceitar."
Seu Roberto respirou e continuou: "Ela perguntou se eu sabia andar de bicicleta e eu respondi que sim. Ela então disse que me daria uma bicicleta. E mais, ela disse que me arranjaria um emprego, de entregador de ração na lojinha de animais da filha dela. Fiquei sem saber o que responder, pois eu não tinha roupas, nem sapatos nem nada. E ainda morava nas ruas. Mas aquela senhora parece ter vindo do céu. Ela, sem eu pedir, disse que compraria roupas e sapatos para mim e, se eu quisesse, poderia morar em um quartinho nos fundos da casa dela. Na hora pensei: Puxa, esssa senhora não me conhece, não sabe de onde eu venho e, sem pensar, me oferece emprego e moradia. Será que Deus existe ou isso não passa de uma brincadeira?" E Seu Roberto continuou seu relato: "Resumindo, meu amiguinho, fui morar na casa daquela senhora e a trabalhar para a filha dela.
E, logo em seguida eu pensei comigo mesmo: nem que eu viva cem anos, tenho certeza que jamais verei um ser humano tão bom quanto àquela senhora. Tenho certeza que nunca mais um ser humano vai me surpreender, vai fazer meu coração bater acelerado com alguma esperança de ver este mundo melhorar. Nunca mais...
É claro que as pessoas dão presentes umas às outras, ajudam quem necessita e coisas afins, doam parte do seu tempo, trabalham como voluntários, etc, mas doar seu último e único dinheiro para trazer felicidade aos outros, posso garantir, achei que nunca veria algo assim nesta vida. Nunca mais...
Quando você, João, me contou a sua história, sua indiferença ao Natal e o seu modo de pensar, doando seu presente para trazer felicidade a outras pessoas, meu velho coração quase parou.
E aí você me pergunta se eu estou lhe dando os brinquedos de graça, e eu lhe respondo: Nem que eu lhe desse todos os brinquedos das minhas lojas para você doar aos seus amiguinhos, não pagaria a alegria e a satisfação que você me deu hoje. Por isso eu lhe digo: Obrigado, meu amiguinho. Eu, que durante anos neguei a existência de Deus, vejo-o perfeitamente em seu rosto, nos seus atos, no seu modo de pensar. Novamente eu lhe digo: Muito obrigado, meu querido amigo."
E assim, Seu Roberto contratou um caminhão e os brinquedos chegaram às mãos dos amiguinhos de João, casa por casa, criança por criança.
Marta usou o dinheiro para reformar sua casa, com a ajuda do padrinho de João, Seu Roberto.
E agora todos os anos os brinquedos das crianças estarão garantidos. E João, que nunca ganhara um brinquedo na vida, passou a comemorar o Natal...