30/11/2017
Dim-dim pra cachorro
Cabra retado! Inteligência única! Mente estrumada, de dar inveja ao Eduardo Cunha. Exercita, nestes dias confusos, função de secretário municipal, profissão das melhores, confortável... meritocracia é isso. Não age por iniciativa própria, claro! Tem que atender orientações vindas do primário, do secundário, do judiciário, do legislatário e do executário. Todavia, tem lá certa autonomia e despudor típicos deste setor eleitor... ops!, profissional. Desde o hastear do pavilhão importantíssimo em defesa da fauna domesticada, da flora intestinal e da primavera de Praga – as três fadinhas da Bela Adormecida do nosso saudoso líder comunista Walt Disney –, além de bichos de pé, espiroquetos, mulas – com e sem cabeças – , do saci piriri – um primo do pererê só que sempre com desarranjo nas tripas – e o Bolsonário, desde então, espetáculos surpreendentes vêm ocorrendo na cidade. Situada em algum ponto do Oceano Atlântico a oeste de Pindorama e a leste do crepúsculo matutino em latitude e longitude definidas, é hoje a urbe mais rica da Via Láctea. Nosso cabra da peste, então, é secretário desta maravilha. Não tendo mais onde enfiar dólares, ienes, guaranis e até reais – anda até um pouco estufado em contraste ao garoto franzino de outrora –, inaugura expediente absolutamente inusitado em todo o universo: show de música para cachorros! Ora, se humanos têm direito à cultura, por que não o teriam os cães? Porém não são, os shows, para quaisquer cachorros! Não!, apenas portadores de pedigrees homologados pelo Canyon Clube do Brasil são admitidos. O repertório é escolhido a dedo; nada dessa infernação comercial que assola o sistema solar. D’jés e blúuuuz de altíssimas qualidades, superiores mesmo, dignos de público com sensibilidade e postura irretocáveis. Artistas de gabarito internacional tocarão abrigados das intempéries sob cobertura absolutamente transparente – preocupado com esta questão nosso secretário mexeu pauzinhos para que fosse aprovada a toque de caixa uma “lei da transparência das tendas” apresentada em sessão solene na câmara dos legislatários sob justif**ativa de que pássaros, macacos e caxinguelês, apesar de serem selvagens – por enquanto –, também teriam direito aos shows. Voltando às tendas: fabricadas em liga de fibra de carbono com kevlar anti-incendiário, blindado contra petistas, pesolzistas, bolcheviques e torcedores do có-rin-ti-á, sustentadas por torres gêmeas univitelínicas oriundas de ovários policísticos e confeccionadas em alumínio uranizado, dão ao local do evento ar sóbrio e romanesco, para não dizer bucólico. Tudo isso alugado por bagatela que gira ai por volta de muitíssimos mil dinheiros/dia variando para mais ou para mais, dependendo da área comprometida... Vá lá, é ligeiramente mais caro que as tendas de Marte e Júpiter juntas, mas... mas... é assim que funciona pô! Isso se devendo, em parte, ao silêncio dos inocentes que, de maneira geral, costumam destramelar a matraca só quando confortavelmente instalados ao redor das mesas de botequins e congêneres. Contudo, vamos ao show em si. Os músicos pareciam estar cantando e tocando na maior felicidade, saltitantes e pirilampeantes. Não se pôde averiguar o cachê da trupe, mas com certeza foi melhor do que os praticados em Marte e Júpiter... juntos. Ao observador mais atento que por ali passava não terá escapado à visão os três ou quatro canídeos nobres em meio às cadeiras vazias; patinhas dianteiras cruzadinhas assim..., orelhas atentas e crescidas em direção à música, demonstrando comportamento somente observado nesse grupo de destaque da zoologia mais recente... Cena de levar lágrimas aos olhos! Afora eles – os cães – um gato, com meia dúzia de pulgas, encarapitado num pé de pau – não era um gato com pedigree e há possibilidades de ter subornado o porteiro – e duas vacas com rabos enormíssimos contratadas para controle natural e sustentável de simulídeos, porvinhas e aédes-do-egito. Pássaros, macacos e caxinguelês possivelmente escafederam-se para outro show mais acessível a espécies inferiores. Tudo isso ocorrendo em bairro chique-no-úrtimo situado ao sul do centro de referência da cidade, uma espécie de aquário descomunal, de cor verde-diarreia-brilhante, projetado por arquitetos especialistas do planeta Mercúrio, que é o planeta mais frio do sistema solar. Obra magníf**a, mais bonita até que a Disneylândia (afirmação de alguns correligionários do idealizador do delírio), inicialmente orçada em dezessete milhões – ou seriam bilhões?, a turma já não anda boa em aritméticas financeiras – reais, mas que – ainda não está terminado o aquário –, quando pronto, não passará dos vinte milhões... libras esterlinas talvez?, ninguém sabe. A localidade – do show, não do aquário –, designada “Kurral”, palavra ligeiramente fora dos conformes que inicialmente pensou-se ter etimologia advinda de um pudim de milho característico da época das grandes plantações deste nobre cereal pelos arredores da cidade que, no tempo do domínio holandês, ou belga, não sei direito, já foi importante polo agrícola dentro do mercosul. Posteriormente admitiu-se a falha hermenêutica, pois a explanação a respeito teria vindo de um representante de etnia normanda que habita por ali já há algum tempo gerenciando uma pousadinha discreta.
–Então é Kurral, de curral mesmo!
– Sim!
– Mas... curral não é para vacas?
– Claro, sempre foi para vacas! Foi dali que alugaram as que estão espantando borrachudos no show.
– Vacas gordas ou magras?
–Aí vai depender da produção de petróleo.
José Paulo de Paula