01/12/2024
Estudo sugere que javalis podem ser fonte potencial de transmissão da hepatite E para humanos
Equipe da Universidade de Barcelona detecta uma estreita semelhança molecular entre as cepas do vírus da hepatite E de javalis e humanos nesta área.
Nas últimas décadas, as populações de javalis aumentaram nas áreas urbanas de Barcelona e em outras partes da Catalunha. Este animal silvestre é um importante reservatório do vírus da hepatite E, o agente causador da doença que afeta mais de 20 milhões de pessoas todos os anos, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Agora, uma equipe da Faculdade de Biologia, do Instituto de Pesquisa em Biodiversidade (IRBio) da Universidade de Barcelona e da Faculdade de Medicina Veterinária da Universitat Autònoma de Barcelona (UAB) identificou uma semelhança molecular relevante entre as cepas do vírus da hepatite E (HEV) de javalis na área metropolitana de Barcelona e os cidadãos desta área. Segundo os pesquisadores, esses dados sugerem que esses animais podem ser uma fonte de infecções humanas por hepatite E na região metropolitana.
Jordi Serra-Cobo, professor da Faculdade de Biologia da UB e pesquisador do IRBio, co-liderou o estudo com Maria Isabel Costafreda, professora do Departamento de Genética, Microbiologia e Estatística, e pesquisadora do Instituto de Nutrição e Segurança Alimentar da UB (INSA) e do Centro de Pesquisa Biomédica em Rede de Doenças Hepáticas e Digestivas (CIBEREHD). Jordi Serra-Cobo alerta que "os resultados devem servir para tomar medidas preventivas e estar atento à possível transmissão do vírus da hepatite E de javalis para os cidadãos da área metropolitana de Barcelona". O estudo, publicado na Science of The Total Environment, também envolveu Abir Monastiri e Marc López-Roig (IRBio) e Maria Costafreda, juntamente com outros pesquisadores do Banc de Sang i Teixits (Banco de Sangue e Tecidos da Catalunha), do Instituto de Pesquisa Vall d'Hebron (VHIR), da Universidade de Lleida e do Serviço de Ecopatologia da Vida Selvagem (UAB).
UM VÍRUS ENDÊMICO NA POPULAÇÃO DE JAVALIS
A área metropolitana de Barcelona é composta por trinta e seis municípios, distribuídos por 636 km2 e povoada por cerca de 3,2 milhões de pessoas. Esta área, que inclui o parque natural de Collserola — uma floresta mediterrânica periurbana de 8.000 hectares, rodeada por centros urbanos — tem uma densidade populacional de javalis entre cinco e quinze indivíduos por quilómetro quadrado.
No estudo, os pesquisadores analisaram as fezes de 312 javalis coletados nesta região entre 2016 e 2021, sete dos quais testaram positivo para a presença do vírus. A comparação dessas amostras, juntamente com seis amostras adicionais de um estudo anterior, tornou possível estabelecer "uma estreita relação filogenética" - isto é, parentesco evolutivo e semelhança genética - com as cepas de HEV de doadores de sangue nesta área. Serra-Cobo, membro do Departamento de Biologia Evolutiva, Ecologia e Ciências Ambientais da UB, observa que "todos os vírus isolados foram classificados dentro do genótipo 3 do HEV".
Além disso, as amostras de javalis com o vírus pertenciam a indivíduos não adultos, o que, segundo os pesquisadores, indica a manutenção endêmica — ou seja, habitual e permanente — do HEV na população de javalis da região metropolitana por indivíduos jovens. Nesse sentido, explicam que "a falta de detecção de HEV em javalis adultos sugere que os animais jovens estão expostos à infecção pelo vírus nos primeiros anos de vida, enquanto os adultos já superaram a infecção e estão protegidos da reinfecção". "Isso sugere que o vírus é endêmico na população de javalis dessa região", acrescentam os pesquisadores.
UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA GLOBAL
A crescente presença de javalis nas áreas urbanas de Barcelona (mas também em outras cidades como Lugo, Roma, Berlim, Gênova ou Hong Kong) deve-se principalmente a fatores como a perda de habitats naturais induzida por atividades humanas. "Dado que a sinurbização - a presença e adaptação de javalis em ambientes urbanizados - de javalis é um fenômeno global, que está aumentando e se expandindo, os resultados deste estudo devem ser úteis para desenvolver e estabelecer programas de monitoramento, vigilância e, eventualmente, controle do HEV tanto na área metropolitana de Barcelona quanto em outras áreas urbanas do mundo", diz Serra-Cobo.
No artigo, os especialistas explicam que "embora a maioria dos casos humanos de hepatite E sejam leves, a infecção pelo HEV causa aproximadamente 50.000 mortes humanas a cada ano, e é particularmente grave em mulheres grávidas, com taxas de mortalidade de até 30%, podendo ser transmitida a bebês".
MEDIDAS DE PREVENÇÃO E INFORMAÇÃO
Entre as medidas para prevenir a transmissão do vírus da hepatite E ao público, os pesquisadores destacam a importância de evitar "o contato com javalis, bem como não comer sua carne crua ou mal cozida". Nos casos em que ocorreu contato, como com caçadores ou agentes florestais, eles recomendam lavar as mãos com água e sabão. "Essa prática remove o envelope lipídico do vírus e o inativa", observam.
Eles também destacam outras medidas relacionadas a animais de estimação. "Os javalis podem invadir as ruas do centro de Barcelona, onde encontram comida em latas de lixo ou jardins urbanos. Estes espaços são frequentados por cães e gatos, que podem ser infetados com fezes de javali e podem contribuir para a propagação da infeção aos cidadãos", alerta Jordi Serra-Cobo.
Nesse sentido, eles recomendam evitar que animais domésticos entrem em contato com fezes de animais selvagens e instalar sistemas para evitar que os javalis derrubem os recipientes de lixo. Os pesquisadores também observam que "também é importante informar o público sobre os fatores de risco para a transmissão da hepatite E de javalis, seja para humanos ou para animais de estimação".
MONITORAMENTO DE LONGO PRAZO DE JAVALIS
O grupo de pesquisa IRBio da UB tem outro estudo em andamento para determinar a dinâmica da infecção pelo vírus da hepatite E na população de javalis na área metropolitana de Barcelona. O investigador sublinha ainda a "importância fundamental" de um acompanhamento e monitorização a longo prazo do estado de saúde da população de javalis, "sobretudo numa altura em que a estrutura e o funcionamento dos ecossistemas estão a mudar a um ritmo sem precedentes, em resultado das alterações climáticas e de fatores antropogênicos".
Fonte: https://www.eurekalert.org/news-releases/1066187