23/01/2025
Coluna Memórias e Histórias: Américo Andolhe - Um Andol não dobra esquina.
Antes de Braga tornar-se município, a vida no pequeno núcleo era marcada por lutas diárias.
Nos anos 1940, a falta de infraestrutura, como luz, água potável, esgoto, estradas e até comunicação, tornava a sobrevivência uma verdadeira batalha. Nesse cenário de dificuldades, histórias de pioneiros como Américo Andolhe se destacaram pela coragem, pelo humor e pelo legado de amizade que atravessou gerações.
Américo Andolhe, um jovem de Cruz Alta, chegou à região em 1945, trazendo consigo as habilidades de um exímio carpinteiro, pedreiro e trabalhador das antigas serrarias. De estatura mediana e magro, com braços fortes e frases icônicas como o célebre “O índio tem que ter muque”, Seu Américo não era apenas um trabalhador incansável, mas também uma figura de grande respeito na comunidade.
Entre as histórias que imortalizaram seu nome, duas se destacam, sendo a mais famosa o ditado: “Um Andol não dobra esquina.” “Andol” é a forma carinhosa de se referir ao sobrenome Andolhe. O trajeto que ele percorria diariamente da serraria do Santo Pazini até sua residência era sempre o mesmo, até que um episódio marcante mudou o rumo da história.
Américo costumava subir pela atual Avenida Marechal Floriano (que, na época, ainda não tinha denominação oficial) e, ao chegar à esquina com a Rua Rui Barbosa, dobrava para descer os últimos 100 metros até sua casa.
Certo dia, após um exaustivo dia de trabalho e uma breve parada no bolicho, Américo seguia de volta para casa. Ao passar pela residência de seu amigo Adelarmo Nunes e ao se aproximar da esquina, um grito provocador ecoou da casa:
“Homem que é homem não dobra esquina!” — desafiava Adelarmo.
Sem hesitar, Américo, conhecido por seu temperamento forte e sangue quente, respondeu:
“UM ANDOL TAMBÉM NÃO DOBRA ESQUINA!”
E, em vez de fazer o habitual trajeto, seguiu em linha reta, contornando um trecho mais longo da avenida até chegar em casa.
O episódio rapidamente se tornou uma lenda local, e, até hoje, o ditado é repetido pelos moradores de Braga como símbolo de coragem e determinação.
Outra história marcante sobre Américo e Adelarmo envolve a peculiar forma de comunicação entre os dois amigos. Apesar de morarem a cerca de 150 metros de distância, a dificuldade de acesso — devido às poucas ruas,sem iluminação e à densa vegetação da época — não os impedia de manter contato diariamente, e sem segredos. Ao anoitecer, trocavam gritos de uma casa à outra, e o famoso “Cuidado, rapaz!” era o sinal para iniciar uma conversa à distância.
“Em um episódio que arrancou gargalhadas de toda a comunidade, sempre ansiosa pelo momento da prosa entre os compadres, Adelarmo deu início ao chamado. No entanto, Américo, que estava ocupado em sua ‘patente’ (o banheiro improvisado de antigamente, geralmente localizado longe da casa), respondeu em alto e bom som:
‘Não posso, rapaz! Tô na patente ca…!'”
A resposta inesperada foi ouvida por praticamente todos os moradores da Vila Braga, que rapidamente entenderam em qual momento Américo fazia suas necessidades. O episódio deixou uma marca de bom humor na memória coletiva da comunidade.
Braga, com todas as suas transformações, preserva a memória de seus pioneiros como Seu Américo e Adelarmo. Suas histórias não apenas resgatam o passado da cidade, mas também celebram a força do trabalho, o poder das verdadeiras amizades e a transmissão de valores que atravessam gerações. Afinal, em Braga, “um Andol não dobra esquina” – e uma boa amizade nunca perde o sentido.
Por Marcos Aurélio Nunes