10/02/2024
Fundação Pedro Calmon apoia publicação que resgata a Bahia dos anos 70
SECULT BA - Leitura e Memória - 03/04/2017
São 200 relatos de uma Bahia viva nos anos 70. Uma Bahia de cultura diversif**ada e lugares paradisíacos, de arte, de presenças renomadas. Tudo isso estará no livro “Anos 70 Bahia”, idealizado, organizado e com redação final do publicitário, fotógrafo e produtor cultural Sérgio Siqueira e do escritor, jornalista e publicitário Luiz Afonso Costa. O livro será lançado nesta terça (4), no Póstudo (Largo de Santana- Rio Vermelho).
“Esta é uma obra coletiva, que começou com uma brincadeira, em 2014, quando começamos a postar fotos dos anos 70 e as pessoas interagiam, relembrando vivências desta época, contando casos. Decidimos que isso daria um livro e, em nove meses, ele saiu. Um processo inédito, portanto, de escrita que traz a história de um tempo em que a Bahia estava no imaginário do mundo. É também um registro histórico de como a Bahia, em especial sua arte e cultura, era possível apesar da repressão. Era brilhante, sem medo de criar, arriscar, vivia mais da emoção do que razão, as pessoas faziam do coração” – Sergio Siqueira.
No evento, o público poderá assistir a telões com imagens e músicas da época, em uma festa que os autores prometem se estender “do pôr do sol à meia noite”, como indica o convite. A publicação, que conta com apoio da Fundação Pedro Calmon/SecultBA, traz a memória de quando o Carnaval da Bahia se tornou referência no mundo, de quando os trios elétricos renasceram e se multiplicaram. Também relembra o surgimento dos blocos afro, dos festivais e espetáculos de dança e teatro em Salvador, dentre outras temáticas.
Divulgando e valorizando a memória contemporânea da Bahia, “Anos 70 Bahia” retrata a reinvenção baiana no contexto social, político e cultural que o Brasil apresentava à época. Tem Gesse Gesse morando em Itapuã, Caetano e Gil voltando do exílio, Novos Baianos, Praça Castro Alves, Berro D’Agua, Icba, Pituaçu, Porto da Barra, Moraes Moreira, Dodô e Osmar, Teatro Vila Velha, Escadarias do Pecado, Bloco do Jacu…além de outros relatos.
O livro tem oito capítulos, foi escrito ao longo de nove meses, de forma on-line, episódio a episódio, por meio de relatos na rede social Facebook. A edição é da Editora Corrupio, sob coordenação editorial de Bete Capinan e projeto gráfico de Valentina Garcia.
“Anos 70 Bahia” é, sobretudo, um livro de memórias de uma geração que experimentou ao mesmo tempo uma tremenda repressão política e de costumes, e um enorme desejo de liberdade, muitas vezes levado às últimas consequências. A Bahia ocupava um lugar de destaque na cena e no imaginário do Brasil. Salvador era um caldeirão de experimentações de liberdades artísticas e comportamentais. Este livro é, assim, um documento histórico, tanto pelas memórias nele contidas, pelos personagens muitas vezes ressuscitados nas lembranças, quanto pela forma inovadora que foi composto. É tanto um documento da nossa história recente, quanto do nosso presente” – Mariângela Nogueira, diretora do Livro e Leitura da Fundação Pedro Calmon.
Serviço:
Lançamento “Anos 70 Bahia” – Editora Corrupio, 232 pgs
Valor: R$40
Data: 4 de abril, a partir das 17h30
Local: Restaurante Póstudo (rua João Gomes, 87, Largo de Santana, Rio Vermelho)
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Sobre
O Bloco Jacu concentrava e saia na esquina do Hotel da Bahia, no Campo Grande. O carro abre-alas na frente, com a divina Valéria em estado de glória, ao lado do artista plástico Luís Jasmin. Todo mundo de cabeça feita, encharcado de cerveja até os pés. A alegria era muita e o cheiro de lança-perfume flutuava no ar. A onda azul tomava conta da avenida e a pororoca seguia levando a multidão, cantando em coro “Tomara que esse ano lhe encontre de novo/no meio da rua/no meio do povo/mortalha encharcada de cerveja até o pé/e a boca lambuzada de acarajé...” O Jacu não tinha cordas e, logo, aquela onda azul se misturava com a multidão e f**ava tudo colorido. Todo mundo podia chegar, era o bloco mais democrático do planeta carnaval. “Venha do norte/meu irmão venha do sul/mas venha morrer de alegria/no seu bloco do Jacu."
WALTINHO QUEIROZ – O Carnaval da Bahia nos anos 70, o carnaval-participação, atraía jovens do mundo inteiro e o Jacu era um dos atores principais dessa polarização, bloco líder da utopia, desfilando celebridades como Fafá de Belém, Pelé, Clara Nunes, Gessy Gesse e outras tantas. Ao lado disso, a minha mãe [Luz da Serra, artista plástica e figura lendária na sociedade baiana] puxava a burguesia, o que fazia do Jacu um paradoxo ambulante, que era o todo misturado e isso é carnaval. (...) O Jaguar, do Pasquim, me disse que a Banda de Ipanema sabia da existência do Jacu e que nós éramos coirmãos. A coirmã do Rio tinha um lado cultural bem forte, tanto que manteve viva uma tradição que o Jacu personif**ava aqui na Bahia – a postura do bloco de metais, do bloco de sopro – e fez uma ponte tão grande que, agora, o carnaval espontâneo de rua no Rio está voltando com intensidade, com esse tipo de formação, que defendi na Bahia em contraponto ao mundo eletrônico. (Depoimento no livro "Minha vida com o poeta", de Gessy Gesse, pg. 227).
WALTINHO QUEIROZ – O Carnaval da Bahia nos anos 70, o carnaval-participação, atraía jovens do mundo inteiro e o Jacu era um dos atores principais dessa polarização, bloco líder da utopia, desfilando celebridades como Fafá de Belém, Pelé, Clara Nunes, Gessy Gesse e outras tantas. Ao lado disso, a minha mãe [Luz da Serra, artista plástica e figura lendária na sociedade baiana] puxava a burguesia, o que fazia do Jacu um paradoxo ambulante, que era o todo misturado e isso é carnaval. (...) O Jaguar, do Pasquim, me disse que a Banda de Ipanema sabia da existência do Jacu e que nós éramos coirmãos. A coirmã do Rio tinha um lado cultural bem forte, tanto que manteve viva uma tradição que o Jacu personif**ava aqui na Bahia – a postura do bloco de metais, do bloco de sopro – e fez uma ponte tão grande que, agora, o carnaval espontâneo de rua no Rio está voltando com intensidade, com esse tipo de formação, que defendi na Bahia em contraponto ao mundo eletrônico. (Depoimento no livro "Minha vida com o poeta", de Gessy Gesse, pg. 227).
grandes festas e todo o ano eu fazia uma nova música. Uma delas foi premonitória: numa segunda-feira de Carnaval, já de noitinha, O Jacu deu uma parada. Exausto, deitei num banco da Piedade. Só acordei no dia seguinte, a praça estranhamente vazia, dois teiús me encarando e eu pensando que tava vendo dois minijacarés. Depois, esfregando os olhos me dei conta que já era Quarta-feira de Cinzas... No caminhão abre-alas reinava absoluta a transformista e cantora Valéria e o povo ia ao delírio! Muitas vezes o pano de uma mortalha era retalhado em tiras, permitindo uma família ou um outro grupo brincar no bloco com a anuência dos outros. Ninguém chiava. Era tudo jacu! Celebridades tivemos muitas, mas não as cortejávamos com a voracidade dos camarotes e megablocos de hoje em dia transformando a festa num espetáculo de insensibilidade social, cujo o violento preço já estamos pagando todos. Enfim, fizemos e amamos um Carnaval que tinha limites, respeitava os seus ritos, celebrava a diversidade, tudo movido à paixão, alegria e birita... que ninguém é de ferro!
Texto compartilhado no perfil de Eva Cristina Freitas (.freitas.79) em 09/02/2024.
Referência
No meio da rua, no meio do povo. A Tarde, 01/03/2001. Link: https://atarde.com.br/bahia/bahiasalvador/no-meio-da-rua-no-meio-do-povo-286059
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Link para adquirir a versão eletrônica: https://www.amazon.com.br/Anos-70-Bahia-contracultura-tropicalista-ebook/dp/B076MCRNWL
Foto: Fernando Noy informa que quem aparece na imagem são Inés e Cacá Dourado.