15/09/2022
Cus D'Amato (1908 - 1985) detinha muitos ensinamentos, que o tornaram em um dos maiores mentores do boxe. Um destes ensinamentos dizia que "as pessoas que nascem redondas, não morrem quadradas", isto é, que uma pessoa jamais poderá ser aquilo que ela não é naturalmente. Ela pode, entretanto, adaptar-se às circunstâncias; e a adaptação é uma das raízes da luta, seja no boxe ou nas artes marciais em geral. A adaptação é o elemento que fará alguém manter a disciplina, mesmo em momentos de extrema tristeza, tibieza, preguiça ou indisposição. Você precisa se adaptar às circunstâncias, e fazer delas o combustível necessário para persistir, o que nas próprias palavras de D'Amato era o "fogo interior": ou ele alimenta a persistência em calma combustão, ou ele queimará tudo e lhe destruirá por dentro.
Yamamoto Tsunetomo (1659 - 1721), o grande autor do Hagakure, nos diz que "ler livros é função da Corte Imperial, mas o trabalho da Casa de Nagano é militar, empunhando a espada de carvalho". Nagano, tenryō (propriedade imperial) do Shogunato de Tokugawa, era a sede do poder militar do Japão do século XVII, e seu trabalho era estritamente de ambito militar. Enquanto a Corte deveria nutrir a mente, o Shogunato deveria nutrir a parte física, o combate. "Mens Sana in Corpore Sano" - Mente sã, Corpo são - diz o famoso adágio do poeta romano Juvenal. "Orandum est ut sit mens sana in corpore sano", isto é, você deveria rezar para obter uma mente sã em um corpo são.
O adágio figura-se na torre da Vila Capanema, entrada antiga, e não por menos. Ele é a essência da filosofia da guerra e do combate, natureza da qual nenhum de nos escapará, pois, "a vida do homem sobre a terra é uma guerra" (Jó, 1, VII), como dita nas Sagradas Escrituras: "Aquele que tem uma bolsa, tome-a; aquele que tem uma mochila, tome-a igualmente; e aquele que não tiver uma espada, venda sua capa para comprar uma." (Luc, 22, ###VI).
O bom guerreiro é forjado na persistência, advinda da disciplina, mas também na prudência, como diz Tsunetomo, em que se "respira 7 vezes antes de se tomar uma decisão". A prudência é a maior aliada do bom guerreiro, e ancorada na disciplina, faz dele uma rocha inquebrantável. Mas mesmo a prudência não deve ser confundida com inação, pois, como diz o mesmo autor, "quando chega a hora, não existe momento para reflexão", e somente a persistência pode mover-lhe para a ação. Foi o caso de Miguel de Cervantes e Camões lutando em Lepanto, foi o caso das legiões romanas de Publius emboscadas na floresta de Teutoburgo.
Quando se diz que a "Luta não para", deve-se ter em mente algo maior que uma mera frase de efeito. Deve-se ter, também, a mentalidade necessária para compreender que ela não cessa, e que ela exige ações concretas. Lutar por alguém e por algo é a essência da vida. É a persistência em execução. E por isso, deve ser, em igual proporção, a essência de um bom agrupamento. Em tempos em que muito se fala de "ideologia" nas torcidas organizadas, há uma certa confusão generalizada. A ideologia é sempre centrada em torno de "amizades": sejam elas eixos de uniões e alianças, sejam elas particulares. O problema de centrar a "ideologia" nisto, é que busca-se primeiro agradar ao próximo, mesmo que mediante troca de benefícios, ao invés de direcionar-se para o necessário, canalizando todas as energias em um único foco: objetivo concreto. E persistência para alcançá-lo.
Lutar é ter Mentalidade. Em nossa entidade e demais agrupamentos por todo o Durival Britto e Silva, houve e há inúmeros combatentes. Lembrados pela persistência, disciplina, controle e guerras travadas pela vida e por um objetivo.
Uma reflexão, para tempos de 'pré-ocupação' e trevas nebulosas desenhando-se sobre o agora gelado, nebuloso e cinzento horizonte.
Não desistam.
Sejam vocês soldados, lutadores, pugilistas,
pais, irmãos, filhos,
Combatentes,
Torcedores.
Cada um desempenha uma função e um papel neste 'tenryō'.
E há muito a ser feito.