01/03/2024
Um dos jogos da minha infância chamava-se Correio Infantil, era da Majora e tinha um carimbo que permitia marcar os envelopes e os selos de brincar como se estivéssemos numa estação de correios. Ir aos correios a sério era, até há uns anos, uma coisa que fazia com prazer, mesmo que tivesse de esperar um bocado pela minha vez de ser atendida. Enquanto esperava, estava atenta ao som do carimbo, às vitrines com novas tiragens de selos, às conversas. Entretanto, os correios foram privatizados, como se fosse boa ideia tornar privado um serviço tão fundamental. Ia ser uma maravilha, disseram, porque tudo o que é privado funciona bem, disseram, e vai ser muito melhor, com menos tempos de espera, novos “produtos”, serviços mais ef**azes. O que se viu foi o tamanho das filas a aumentar, o número de funcionários a diminuir e, em muitos locais do país onde os CTT asseguravam uma série de serviços essenciais, o que se viu foram as próprias estações de correios a desaparecerem. Há novos serviços, lá isso há: os CTT, agora, também são um banco, reservando-se pelo menos um dos balcões da estação que frequento para esse departamento. Depois, há os livros, espalhados por vários escaparates. Entre a oferta bibliográf**a, há promessas para acabar com a diabetes ou a depressão, instruções para ser rico e feliz, manuais para “deixar de se preocupar” (!), romances de desconfiar e alguns livros de receitas assinados por pessoas que aparecem na televisão, para além de várias variantes de coisas de Auschwitz, esse filão editorial que vemos colonizar as prateleiras sem que a vergonha nos engula. E fora da estação de correios, no departamento de entregas de correspondência e afins, o problema continua, com cartas e encomendas a demorarem demasiado a chegar ao destino (algumas a não chegarem) e com carteiros e carteiras a fazerem rondas demasiado extensas para o tempo que lhes é dado (e, desconfio, sem remuneração à altura). Quando vierem privatizar o que ainda sobra de saúde e educação públicas, a ver se não nos esquecemos dos serviços que pioraram ou desapareceram, nem dos CTT da aldeia, que fecharam porque “não se justif**ava”.
1 Março 2024