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Colectânea de Poesia
Volume 1 PALAVRAS DE CRISTAL é a primeira Colectânea de Poesia publicada pela editora MODOCROMIA

06/01/2023

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INTRODUÇÃO DE "PALAVRAS DE CRISTAL I VOLUME"Texto de Domingos Lobo (Em 2013)
29/07/2022

INTRODUÇÃO DE "PALAVRAS DE CRISTAL I VOLUME"
Texto de Domingos Lobo (Em 2013)

INTRODUÇÃO - UMA COLECTÂNEA DE PALAVRAS ANDANTES

A poesia é um acto de criação solitário, de silêncios, de debate íntimo e de íntimas interrogações, de exposição inquiridora, no sentido distanciador e brechtiano; uma tentativa de reconduzir o pensamento criativo, osmose sensorial e crítica, ao que o marxismo entendia ser o homem total. A interrogação permanente faz parte do jogo dialéctico entre autor e o cúmplice leitor. O autor interroga-se, para que a ressonância interrogativa atinja o outro; envolvendo o leitor nas contingências das máscaras discursivas e dos processos cognitivos que as palavras transportam. Um dos hábeis artífices deste mecanismo de exposição/introspecção/interrogação foi o poeta Armindo Rodrigues, ao qual Saramago chamou “o poeta perguntador”.
Esta colectânea será, na pluralidade das vozes que a formam, um livro em extensa, profícua, permanente e extasiada reflexão sobre a arte poética, ou seja, sobre a capacidade de ainda hoje, e face às derivas, ao caos da contemporaneidade, ser possível urdir as palavras com vagar, tomar-lhes o peso a pulso na exasperação exacta do acto criativo, e retomar as fontes, regressar à memória sabendo que, colectivamente, como num coro de vozes, mesmo que dissonantes (diria, saudavelmente dissonantes) nos possamos expor, dizendo os insondáveis mistérios que assim nos fazem andar ao rés das palavras, tecendo com as cordas de um clavicórdio interior, este mar de urgências, de ressonâncias íntimas, de épicas, profusas vibrações.
As colectâneas – e esta parece-me singularmente conseguida e cuidada - têm servido, em pátria de tolhimentos culturais diversos, e face à tímida iniciativa editorial tendente a abarcar a pluralidade de vozes poéticas que entre nós se expressam, como uma possibilidade de revelação e de divulgação da obra e de reconhecimento público dos seus autores.
O tempo dos grupos literários, que fundavam o essencial do seu exercício polemístico e criador à mesa dos cafés, do Gelo ao Paladium, do Monte Carlo ao Vává, transportado aos ombros os restos do surrealismo a julgar-se cadáver ressurrecto, o neo-realismo, em discurso de sombras, a perpetuar-se, renovado, 3.ª geração até aos idos de Abril de 1974, e a Geração da Poesia 61 a esboroar-se pelo delta das urgências de escreviver, ou as solidariedades estético/ideológicas que os conduzia ao labor literário e à publicação – em tempo resistente em que os editores eram igualmente cúmplices do risco, companheiros de jornada dos autores – perdeu-se na voragem dos dias ignaros e na lógica rapace do lucro imediato. Outro mundo se anunciava, e nele, um pouco à deriva, em busca de identidades, os autores isolavam-se e as editoras passavam a ser geridas como empresas, afastadas do processo colectivo e geracional que "sonhara mudar o mundo". Esta colectânea, o que a sua génese prefigura, traz-nos de regresso ao tempo das solidariedades partilhadas, de uma capacidade, que parecia perdida, de juntarmos num mesmo espaço físico, este livro, modos de dizer, testemunhos do fogo, ritmos, sons e imagens diversas. Ou seja, como escreveu Isidore Ducasse: La poésie doit être fait par tous.
Pátria dita "de poetas", expressão que vale o que valem os lugares-comuns, raras são as edições de poesia que entre nós vão além dos 500 exemplares de tiragem, mesmo para autores reconhecidos e com obra vasta. Apesar da poesia ser, dizem, o nosso lídimo território expressivo. Isto, porque os poetas teimam em mutuamente se ignorar, em deriva suicidária agravada pela ascensão aos lugares de mando de uma tecnocracia possidónia e em delírio permanente, culturalmente boçal, que pretende reduzir-nos a meros consumidores acríticos, condição sistémica que o sociólogo Axel Honneth denunciou, a qual consiste no primado do menor prazer absoluto e este consignado ao atordoar dos sentidos, mandando às urtigas a sensibilidade criadora, a capacidade reflexiva, a agudeza crítica. A Poesia, em clima assim, tem espaço de manobra ínfimo e residual.
Resta-nos, portanto, neste território desolador, a persistência de algumas editoras, de alguns municípios e associações culturais que se não deixam tolher pela desordem geral e tentam o isolado grito que possa, fugazmente, estremecer este regresso anunciado ao absurdo caos da ignomínia.
Raul Proença, ao reflectir sobre das funções da literatura, refere que o escritor veio ao mundo “para compreender o terrível destino dos homens, ter na alma a sede de infinito e, ao mesmo tempo, a certeza do ilimitado e do precário. Sentir que a consciência é um átomo no seio do universo, esse vazio imenso”. Este sentido do vazio e da consciência, da nossa responsabilidade individual, atrelado ao absurdo existencial (que não preocuparia Raul Proença mas que Pessoa já intuíra num poema famoso), será posteriormente desenvolvido por Sartre no ensaio O SER E O NADA. Mas já Bernardim Ribeiro, nas suas éclogas, sabia da insatisfação que o poeta transporta, do seu inatingível supremo, que o poema feito é apenas uma estrada que percorremos sabendo que atrás de um poema outro despertará, e, enquanto vivos, nessa estrada caminharemos de esperança em esperança. Ou seja, de utopia em utopia até à palavra derradeira.
Se Bernardim Ribeiro, no nosso fulgurante século XVI, penetrou e definiu, no sentido etimológico e sensitivo a palavra saudade, deu-nos, igualmente um mais vasto entendimento do ilimitado e do precário que a função literária é, dado ser o leitor, e não o autor, a definirem o alcance, o precário ou o perene, da coisa literária – o autor, após a obra concluída, perde-lhe o rasto: O livro há-de ser do que vai escrito nele, diz-nos Bernardim Ribeiro à laia de descarte. Assim, este livro o será: do que nele vai escrito.
A poesia é, segundo Armando Silva Carvalho, um modo antigo de descer aos ossos, e é, igualmente, a forma mais perene de fixar a memória, de ordenar o caos, de os poetas se pôrem em causa, de individualmente se responsabilizarem perante si e os outros – poliédrico espelho de retornos. Um lugar de procura e de assombro, de cognitiva introspecção, de íntima desmesura, também de referências intertextuais dado que estes caminhos já outros, muito antes de nós, desbravaram.
Todo o escritor é um escritor de História, que nos conta contando-se. Por isso a arte poética é uma arte “impura” dado inscrever-se no real e nas particularidades que sobre ela, realidade, nos é dado verter. Assim, a arte literária não se define apenas pela “função poética” mas essa funcionalidade é produto de componentes outras, logo de tempo, lugar, circunstância – ou seja, toda a literatura se relaciona, como ensinou Jacinto Prado Coelho, com a história, a biografia, a sociologia, a psicologia e a psicanálise. O poeta está em tudo, e tudo o que é humano não lhe será estranho.
Como nesta colectânea, ampla, pluralmente, se confirma.

In PALAVRAS DE CRISTAL
Domingos Lobo

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