26/08/2023
A Revista Espaço Ameríndio gostaria de anunciar a chamada para o próximo dossiê temático a ser editado em nossa publicação, cuja organização ficará a cargo de Clémentine Maréchal (IEB), Daniela Fernandes Alarcon (MN/UFRJ) e Vinícius Cosmos Benvegnú (UFAM), com o eixo temático central sendo: "Processos de Recuperação Territorial e Formas de Mobilização Indígena na América Latina". Os interessados em enviar manuscritos para a composição do presente dossiê podem submeter seus textos junto à seção "Dossiê" do site da Espaço Ameríndio entre os dias 26 de Agosto de 2023 e 31 de Outubro de 2023.
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Processos de recuperação territorial e formas de mobilização indígena na América Latina
Clémentine Maréchal, Daniela Fernandes Alarcon e Vinícius Cosmos Benvegnú
As retomadas, autodemarcações e processos de recuperação territorial em geral têm se destacado na conformação de um campo de pesquisa relativamente novo nos estudos antropológicos no Brasil. Eles vêm sendo considerados, por diferentes autores, ações diretas de caráter anti ou decolonial, levadas a cabo em um quadro de descumprimento pelo Estado de suas responsabilidades relativas à demarcação de terras indígenas, e de prevalência de políticas indigenistas orientadas pela negação dos direitos dessas populações e pela perpetuação do esbulho.
Esta proposta de dossiê se inscreve em uma vertente de etnografias realizadas mais recentemente por pesquisadores indígenas e não indígenas junto a povos das diferentes regiões do Brasil em torno de formas de mobilização política e processos de recuperação territorial (Alarcon, 2013, 2020; Benites, 2014; Cruz, 2017; Loures, 2017; Molina, 2017; Morais, 2017; Cardoso, 2018; Amado, 2019; Durazzo, 2019; Souza, 2019; Maréchal, 2020). Considerados em conjunto, esses e outros trabalhos sugerem pistas para a análise da atuação indígena contemporânea.
Os despertares indígenas, para retomar a poética de Amado (2019), apontam para a conexão entre território, experiências vividas e lembranças, na perspectiva de uma memória construída na luta. Nesses processos, retornam e revivem nos territórios agentes humanos (parentes vivos e mortos, compadres, vizinhos, aliados) e extra-humanos (encantados, visagens, espíritos, animais, plantas), enquanto projetos de vida coletivos se constroem cotidianamente. Emergem, então, alternativas políticas, econômicas, educacionais e culturais concretas, desestabilizando processos históricos de dominação e exploração.
Quando estendemos nosso olhares para os demais povos indígenas que vivem na América Latina, vemos que essas discussões vêm sendo travadas há algumas décadas, a partir das experiências de luta zapatistas (Baronnet, 2009; Brancaleone, 2015; Gutiérrez Luna, 2017), do povo Mapuche (Campos, 2012; Marimán, 2012, 2015) e dos povos andinos (Cusicanqui, 2016; Mamani, 2010), entre tantos outros. Esses estudos frequentemente problematizam conceitos como autonomia, autodeterminação, autogestão e (de)colonialidade, bem como as relações dessas populações com o Estado e o capitalismo.
Nessa perspectiva, este dossiê se abre para artigos que abordem processos de recuperação territorial e distintas formas de ação política, destacando-se a resistência a projetos de “desenvolvimento” e as experiências alternativas à dinâmica do capitalismo colonial/moderno. Os artigos devem estar embasados em pesquisa etnográfica ou historiográfica, focalizando a atuação dos povos indígenas na América Latina. Temos especial interesse em receber trabalhos produzidos por pesquisadoras e pesquisadores indígenas. Com isso, tencionamos dar visibilidade não apenas aos processos analisados, mas também à ocupação pelos indígenas da universidade e de outros espaços de produção de conhecimento.