25/06/2023
A saga de dona Pureza Loyola, a mulher que partiu em busca do filho e, no caminho, denunciou a existência do trabalho escravo moderno no Brasil
Em sua caminhada solitária à procura do filho, Pureza passou por fazendas, registrou maus tratos, gravou vozes de gente oprimida à base de chicote e trouxe à tona as condições terríveis de trabalho a que pessoas simples eram submetidas, em plenos anos 90.
A corajosa mulher enfrentou gente armada e políticos e mudou para sempre a história do trabalho no Brasil.
Dona Pureza Loyola era viúva e cuidava do filho trabalhando em uma olaria, em Bacabal, Maranhão. Em 1992, seu querido rebento resolveu que iria buscar uma vida melhor em garimpos do Pará. Ele desapareceu.
Sem dar notícias, Pureza abandonou a casa na cidade maranhense e iniciou uma epopeia por fazendas, carvoarias e garimpos do Maranhão e Pará.
Onde Pureza passava, oferecendo serviço de limpadeira e cozinheira, ela encontrava pessoas escravizadas. Gente com falta de esperança nos olhos de tanto sofrimento da labuta.
Olhares e vocabulário simples, quase todos não sabiam ler ou contar dinheiro. Eram homens e mulheres escravizados dentro de fazendas, feudos modernos. Em um sistema em que a pessoa era agregada na fazenda, mas não conseguia sair porque contraía dívidas na venda do local.
A caminhada de Pureza ocorreu entre 1993 e 1996. Ela passou pelos estados do Maranhão e Pará e fez uma quantidade enorme de registros em fotos, áudios e até vídeos.
Encontrou pessoas que foram escravizadas 10, 15 até 20 vezes dentro de fazendas. Quando levou a denúncia para o Estado, muitos políticos tentaram tirar sua legitimidade, pois alguns deles eram donos das fazendas escravizadoras.
Parece incrível, mas até meados dos anos 90, havia uma negação do próprio Estado sobre a existência de trabalho escravo no país.
A coisa mudou com as denúncias de Pureza. O então presidente FHC, aconselhado por Ruth Cardoso, abriu portaria e iniciou os grupos móveis do Ministério Público do Trabalho que, junto com a polícia especializada e procuradores, percorriam fazendas e libertavam pessoas.
E nos primeiros anos foram mais de 50 mil indivíduos que viviam em condições indignas.