11/09/2024
TORDESILHAS
O Tratado
João Barcellos
A observação d´instinto histórico relativa à circunstância ocorrida em 5 de Setembro de 1494 é, habitualmente, “Ah, o Tratado!”.
Aquela acção político-diplomática orientada pelo rei João II foi uma óptima estocada geopolítica nos interesses d´além-mar gritados pelo papado católico e a rainha Isabel d´Espanha.
Desde o naufrágio e a sobrevivência de Sanches Brandam, capitão da Marinha Mercante, em 1342, a serviço do rei Afonso IV, filho de Dinis, sabia-se, nos cais d´Europa, que Portugal estava de posse de um Brazil, ou o Brazil of the Oportugal, pois, o capitão havia recuperado o navio com ajuda de nativos da terra a oeste de Cabo Verde, e que Afondo IV denominaria, em Fevereiro de 1343, como terra do Brasil, ou de Brandam, em carta ao papa Clemente VI. E ´brasil´, porque Brandam tinha reconhecido a árvore de tinta ´cor de brasa´ idêntica à adquirida (digo, ao pó de tinta brasa) no oriente pela Estrada da Seda para ser processado o cais da Liga Hanseática (e Portugal tinha escritório em Brugges, onde Pedro escreveria a famosa carta a seu irmão Duarte, deleite lítero-historiográfico até hoje). E então, nessa circunstância ancestral para as navegações, o capital havia descoberto, ao acaso, a estrada marítima para a melhor arvore de tinta brasil que se havia conhecido. Aquele Oportugal das rolhas e do vinho não seria o mesmo e Lisboa tornou-se o cais do mundo novo e da tinta brasil.
Entretanto, políticas d´alcova e traições e estúpidas aventuras coloniais n´África, fizeram adormecer essa história, mas não esquecer. Por isso, entre Pedro, duque de Coimbra e Regente (dito o das 7 partidas) e o seu neto e rei João II, surgiu uma geopolítica de interesse n´além-mar, porque Pedro havia posto os olhos num mapa precioso com as viagens oceânicas dos chineses, nos Anos 20 dos Séc. 15 e, sabiamente detectado um tesouro: o mapa de fra Mauro, em Veneza. Se o rei Dinis deu início à Marinha Mercante, o infante Pedro (o das 7 partidas) iniciou a estratégia e logística para a odisseia oceânica portuguesa. E, logo após a descoberta de algumas ilhas atlânticas (Açores e Madeira, no Séc. 15), com base no mapa-múndi de fr Mauro e novas navegações na costa africana, o rei João II elaborou o Plano da Índia concretizado ao tempo de Manuel I, e foi essa actividade cartográfica e exploratória na era pedro-joanina que obrigou a um tratado para limitar as posses ultramarinas de Portugal e Espanha com o s**o azul do papado católico.
E em 5 de Setembro de 1494, sob orientação do rei João II e os seus conselheiros reinóis, é realizado o Tratado de Tordesilhas, que já sido ´autorizado´ pela rainha Isabel d´Espanha, ao saber ela que Portugal tinha todas as informações relevantes acerca do Novo Mundo e da árvore brasil.
Portugal e Espanha eram então as potências ocidentais com terras descobertas e a descobrir, logo, o tratado surgiu pra coibir as pretensões espanholas sobre as terras já mapeadas pelos portugueses. Com o conhecimento da Circunstância de 1342, o rei João II propôs como linha de demarcação o meridiano 370 léguas a oeste da ilha de Santo Antão no arquipélago de Cabo Verde. Servia a ambos os lados ibéricos. Ficava tudo a meio caminho entre as ilhas cabo-verdeanas e as caraíbenhas: a leste do meridiano eram terras portuguesas e a oeste eram espanholas.
Detectou-se, então, que na verdade as terras seriam de quem as conquistasse militar e catolicamente (ou seja: colonialmente), por isso a expressão “ah, o Tratado”, que ainda hoje se escuta nos gabinetes de história e da diplomacia.
É interessante (a)notar que nem naquela época as duas potências se interessaram pela terceira nação ibérica: a região de Couto Mixto, entre Portugal e a Galiza – quiçá, pela normalidade da governança anarquista ali instalada, mas que chegou a 700 anos de presença geopolítica., o que nem na história ibérica consta... Ora, as atenções estavam nas terras d´além-mar, pois, a governança anarquista se esvaziaria em pouco tempo pelo isolamento económico.
A finalizar, Senhoras e Senhores, falar d´O Tratado é falar também de fronteiras piscatórias e do perigo turco; no primeiro caso para diminuir a guerrilha piscatória ibero-africana, no segundo caso, para fazer frente ao avanço islâmico na Europa.
Espero que esta breve palestra possa levar-vos a outras leituras para buscarem mais fontes para outras aferições historiográficas.
Obs.: Texto no português anterior ao famigerado e criminoso ´acordo´ ortográfico.
Leituras
A MALDIÇÃO DA MEMÓRIA DO INFANTE DOM PEDRO E AS ORIGENS DOS DESCOBRIMENTOS PORTUGUESES – Alfredo Pinheiro Marques. Centro de Estudos do Mar: Portugal / Figueira da Foz, 1994.
DESCOLONIZANDO A NARRATIVA HISTÓRICA – João Barcellos, in ´Palavras Essenciais´, Volume 17. Ediç Centro de Estudos do Humanismo Crítico, Grupo de Debates Noética e Edit Edicon. Portugal e Brasil.
ESTUDOS PALEOGRÁFICOS – Ramón Blanco. Laserprint editorial ltda. São Paulo / Brasil, 1987.
FORTALEZA: A PONTA DO NOVO MUNDO – João Barcellos. Edit Edicon + Terranova Comunic. Brasil, 2021.