13/02/2025
Justiça Eleitoral em Foco: "Quando Oportunidade e Legalidade Se Cruzam"
A Procuradoria Regional Eleitoral de São Paulo, por meio do Procurador Eleitoral Regional Auxiliar Dr. Márcio Domene Cabrini, emitiu recentemente um parecer que traz à tona questões cruciais sobre o funcionamento da Justiça Eleitoral, as garantias processuais e os limites temporais na busca pela inelegibilidade de candidatos. O caso em questão, envolvendo o Recurso Contra Expedição de Diploma (RCED) ajuizado por Marcos Kinkas, levanta debates importantes sobre o papel do Ministério Público Eleitoral, a segurança jurídica e a lisura do processo eleitoral.
O Cenário: Dois RCEDs, Mesmos Fatos
Marcos Kinkas, autor de um RCED, apresentou os mesmos fatos e fundamentos já narrados em outro recurso, proposto anteriormente pelo Ministério Público Eleitoral de Caraguatatuba. No entanto, o parecer emitido pelo Procurador Regional Eleitoral aponta para um problema técnico-jurídico: a alegada inelegibilidade de Maurílio, que fundamenta o pedido de Kinkas, estaria preclusa. Isto é, deveria ter sido levantada no momento do registro de candidatura, e não agora, após a eleição, por meio do RCED.
Com base nesse entendimento, o Procurador opinou pela extinção do RCED proposto por Kinkas, sem julgamento do mérito, e pela manutenção da expedição do diploma de Maurílio.
A Preclusão e a Segurança Jurídica:
O parecer da Procuradoria escancara um princípio fundamental do Direito Eleitoral: a preclusão. Em termos simples, a preclusão é a perda do direito de se manifestar sobre determinada questão em razão do decurso do prazo ou da prática de um ato incompatível. No caso de candidaturas, o momento oportuno para questionar a inelegibilidade de um candidato é durante o processo de registro de candidatura. Após esse prazo, salvo situações excepcionais previstas na legislação, não é mais possível reabrir a discussão.
Essa regra visa garantir a estabilidade e a segurança jurídica do processo eleitoral. Imagine um cenário onde candidatos eleitos pudessem ter seus diplomas cassados a qualquer momento, com base em alegações que deveriam ter sido apresentadas antes mesmo do início da campanha. Isso criaria um ambiente de incerteza, prejudicando o funcionamento da democracia e a confiança dos eleitores no sistema.
Uma Questão de Estratégia ou Justiça?
Não se pode deixar de questionar: por que Kinkas, ao ajuizar seu RCED, não levantou a inelegibilidade no momento apropriado? Há quem veja nisso uma falha estratégica; outros podem interpretar como uma tentativa de tumultuar o processo eleitoral. Seja qual for o motivo, o parecer da Procuradoria reforça a importância de respeitar os prazos e as etapas processuais para garantir a legitimidade das eleições.
Por outro lado, o caso também levanta reflexões sobre o papel dos atores eleitorais – candidatos, partidos, Ministério Público e eleitores – no zelo pela lisura do processo. Se há indícios de irregularidades graves, até que ponto o formalismo processual deve prevalecer sobre a busca pela justiça material?
Reflexões Jurídicas e Políticas:
O parecer do Procurador, ao recomendar a extinção do RCED de Kinkas, sem julgamento do mérito, cumpre rigorosamente o que determina o Código Eleitoral. No entanto, também abre espaço para discussões éticas e políticas. Será que as regras processuais, ao excluírem questões que não foram levantadas no momento correto, acabam por permitir que situações potencialmente ilegais passem sem escrutínio?
Além disso, a duplicidade de RCEDs, com fatos idênticos apresentados por diferentes partes, sugere um possível uso estratégico – ou até abusivo – dos instrumentos processuais. Isso reforça a necessidade de maior fiscalização e aprimoramento das normas eleitorais para evitar que o sistema seja utilizado com objetivos que extrapolem o interesse público.
O Papel do Ministério Público Eleitoral:
Outro ponto de destaque é a atuação do Ministério Público Eleitoral, que foi quem inicialmente ajuizou o primeiro RCED contra Maurílio. Isso demonstra que o órgão está atento às possíveis irregularidades no processo eleitoral, mas também evidencia a necessidade de coordenação entre os atores envolvidos. O segundo RCED, proposto por Kinkas, revela um possível descompasso que pode gerar sobrecarga no sistema judicial e, em última instância, prejudicar a celeridade da Justiça Eleitoral.
Conclusão: O Que Está em Jogo?
Mais do que um caso isolado, o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral serve como um lembrete sobre a importância de respeitar as regras do jogo democrático. A preclusão não é apenas um detalhe técnico, mas um pilar que sustenta a segurança jurídica e a estabilidade do processo eleitoral.
No entanto, o caso também nos desafia a refletir: estamos prontos para equilibrar o formalismo jurídico com a busca pela justiça material? Como evitar que disputas eleitorais se transformem em batalhas judiciais intermináveis, minando a confiança da sociedade no sistema?
O RCED de Kinkas pode ter sido extinto, mas as perguntas que ele levanta continuarão ecoando. Afinal, a democracia não é um estado de conforto, mas um constante exercício de vigilância e debate.
Guilherme Araújo
Jornalista Investigativo - MTB nº 79157/SP
ABI/RJ - n° E-002885