20/08/2024
Enquanto a crise económica empurra mais cidadãos para os contentores de lixo em busca de restos de comida, os gastos supérfluos e megalómanos do governo revelam-se cada vez mais absurdos e revoltantes. Em Istambul, Colense Sebastião de Sousa decidiu unilateralmente mudar as instalações do Consultado-Geral para um bairro de luxo, com uma renda cinco vezes mais cara. Como o governo turco reprovou as novas instalações e obrigou a fazer obras, desde há oito meses que o expediente tem sido despachado em bares e restaurantes locais.
por RAFAEL MARQUES DE MORAIS
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À medida que a crise económica empurra mais cidadãos para os contentores de lixo em busca de restos de comida, os gastos supérfluos e megalómanos do governo revelam-se cada vez mais absurdos e revoltantes.
Vejamos o caso do Consulado-Geral de Angola em Istambul, a capital económica da Turquia. Desde Janeiro passado – há oito meses – este consulado apenas despacha expedientes oficiais em bares locais, apesar de estar instalado num dos bairros mais luxuosos da referida cidade, para o qual pagou rendas antecipadas no valor de cerca de 300 mil euros.
Porquê?
Em Dezembro passado, segundo fontes fidedignas do Ministério das Relações Exteriores (MIREX), o cônsul-geral, Colense Sebastião de Sousa, decidiu que as instalações onde funcionava o consulado, com uma renda mensal de 2500 euros, não eram condignas para si. O consulado, então situado no Bairro Yesilköy (Bakirköy), Halkali n.º 14A, ocupava um edifício com dois pisos, rés-do-chão e primeiro andar, além de uma cave (com gabinetes) e um sótão, para um total de sete diplomatas. Este endereço era de fácil acesso, uma vez que se situava a três minutos das principais estações de comboio, autocarros e metro.
Para substituir estas instalações, o cônsul arrendou uma residência em Reşitpaşa, Gündüz Sefası Sk. No:2/1, uma das zonas mais luxuosas da cidade, onde não há nenhum outro consulado. Segundo as fontes do Maka Angola, este arrendamento foi realizado sem informação prévia ao Ministério dos Negócios Estrangeiros da Turquia, conforme exigem os procedimentos protocolares estabelecidos na Convenção de Viena.
Colense Sebastião de Sousa terá desembolsado cerca de 300 mil euros para pagar adiantadamente dois anos de arrendamento, a contar de Janeiro passado. Portanto, de uma renda mensal de 2500 euros, o Consulado-Geral de Angola em Istambul passou a pagar 12 500 euros por mês, ainda por cima pagos adiantadamente.
Por sua vez, o governo turco reprovou a mudança de endereço do consulado, após ter sido informado da sua consumação, devido à inconformidade com os protocolos de segurança exigíveis ao funcionamento de qualquer missão diplomática. A nossa fonte do MIREX explica que, para contornar a situação e evitar um incidente diplomático, o governo turco aceitou a mudança, mas exigiu que fossem realizadas obras no espaço arrendado, para o adaptar às regras de segurança diplomática.
Em Março passado, o Novo Jornal já revelava esta rocambolesca situação. E o certo é que as obras decorrem há mais de três meses, sem que haja informação disponível sobre o seu custo e o tempo de finalização previsto.
Entretanto, desde que se procedeu à inusitada mudança de instalações, enquanto alguns funcionários permanecem em casa, o endereço operacional do Consulado-Geral de Angola tem variado entre bares, cafés e restaurantes – conforme denunciam, sob anonimato, alguns membros da comunidade angolana na Turquia.
Estes cidadãos referem que o vice-cônsul, Domingos Buanga, e o oficial de protocolo Anselmo Sebastião Francisco de Paula, sobrinho do cônsul-geral, privilegiam esses lugares de comes e bebes para expedirem os salvos-condutos e tratar de outros assuntos consulares na presença dos requerentes. No “absurdistão” do nosso governo, é o que se pode chamar de "missão diplomática nos bares". A realidade supera a ficção.
O Consulado-Geral de Angola na Turquia foi inaugurado a 9 de Junho de 2023 pelo ministro das Relações Exteriores, Téte António, que nomeara o embaixador Colense Sebastião de Sousa como primeiro cônsul-geral no país de Kemal Ataturk.
De 2020 a 2023, o referido embaixador ocupou o cargo de director do gabinete do ministro das Relações Exteriores. Antes, serviu na mesma função quando Téte António exercia o cargo de secretário de Estado das Relações Exteriores.
Actualmente, o Consulado-Geral tem um total de sete funcionários de recrutamento central, enviados de Luanda. Segundo pesquisa do Maka Angola, esse número de diplomatas suplanta o de qualquer outra legação em países africanos e o da maior parte dos consulados de outros países na Turquia.
Entretanto, em 2023, o presidente da República, João Lourenço, exarou o Decreto Presidencial n.º 189/23, de isenção de vistos de turismo para 98 países, incluindo a Turquia. Assim, a presença de centenas de funcionários consulares no exterior do país, antes responsáveis por emitir os referidos vistos, tornou-se redundante. Ao contrário do que seria de esperar, porém, esta medida não foi acompanhada da necessária redução do pessoal consular, com vista a racionalizar os recursos financeiros e humanos do país.
Aliás, especialistas do MIREX apontam para que tenha havido um aumento do pessoal consular. Não por acaso, actualmente, várias embaixadas estão há três meses sem receber salários, dado o nível exorbitante de gastos com as missões diplomáticas e consulares, bem como a crise financeira que o país atravessa.
Conhecido como caixeiro-viajante, o ministro Téte António tem-se revelado incapaz de organizar a gestão e a racionalização dos recursos à disposição do Ministério das Relações Exteriores.
A prova mais flagrante do descaso de Téte António é o comportamento do seu protegido, o cônsul-geral Colense Sebastião de Sousa. Consta que este simplesmente ignora o embaixador de Angola na Turquia, José Patrício, sediado na capital política Ancara, a quem deveria, em primeira instância, reportar as suas actividades.
Durante uma pausa nocturna, enquanto escrevíamos este artigo, passámos pela Avenida dos Combatentes, onde, junto às bombas da Sonangalp, um grupo de sete jovens aparentemente saudáveis disputavam os restos de comida de um contentor de lixo. É uma imagem que se vai reproduzindo em Luanda, onde o desemprego e a fome remetem cada vez mais jovens para a rua.
Perante esta triste imagem, é impossível não pensar na insensibilidade de muitos dirigentes angolanos, que continuam a fazer do erário público um s**o para custear as suas vaidades pessoais e os seus processos de desumanização.
À medida que a crise económica empurra mais cidadãos para os contentores de lixo em busca de restos de comida, os gastos supérfluos e megalómanos do gover